Niraldo Santos (Associado da CLIPP) Como o mais-um um pode ser um agente provocador e,…
A diferença do psicanalista da Escola
Carmen Silvia Cervelatti
(EBP/AMP)
“Em uma Escola, tudo é da ordem do analítico. É um axioma, a condição para que uma Escola seja interessante.”[1]
Uma pequena articulação entre dois momentos da enunciação de Miller: 2000 – Teoria de Turim, quando articulou a Escola é um sujeito e o Seminário de 24 de junho de 2017, nomeado como passe da Escola, após pontuar as repetições do mesmo nos diversos momentos da espiral da história do Campo freudiano, desde a fundação da Escola freudiana de Paris em 1964, passando pela ECF em 1980. Três momentos “ano zero”.
A lógica da Escola está assentada no não-todo, no mais-além do Édipo, das identificações e do funcionamento do grupo baseado na exceção do sujeito todo saber. Nela não há lugar para o “nós” e “eles”, reino do imaginário e da rivalidade. Suposição de saber e laços agalmáticos são condições para sua ex-sistência.
“A Escola-sujeito quer dizer que a Escola é uma experiência inaugural, no sentido da experiência analítica. A Escola é inaugural na medida em que ela inaugura um novo sujeito suposto saber, e que sua história é uma série de fenômenos analisáveis.”[2] Miller também aproximou a Escola-sujeito enquanto Escola sujeito suposto saber, a partir da frase de Lacan: “Você pode saber o que pensa a Escola freudiana de Paris”.[3] Sim, nossa Escola sujeito suposto saber, também objeto libidinal, objeto agalmático, a outra face da transferência.
O desejo do analista não é um desejo puro, metonímico, sem ponto de capitonê, não é um desejo de nada ou de algo. O desejo de Freud era obter a verdade; já para Lacan o desejo do analista é o desejo de “obter a construção do fantasma fundamental, a deflação do desejo, a redução dos objetos do desejo ao objeto a”[4]. Nada de indiferença!
O desejo de Freud em relação à psicanálise, como todo desejo, encontrou sustentação no fantasma. Na relação do sujeito, vazio, com o objeto causa, ele soube ressoar, a transmissão funcionando como causa a muitos outros que se uniram em torno dele, formando a IPA.
“Lacan interpretou, decantou, formalizou, o salto que há entre a causa do desejo de Freud e a causa freudiana como tal. Aplicou a lógica ao desejo de Freud para separá-lo de sua particularidade, desenraizá-lo da fantasia paterna, liberar a forma dita do desejo do analista.”[5] Como disse Lacan no Seminário 11, se trata de obter a diferença absoluta: “separar o sujeito dos significantes mestres que o coletivizam, de circunscrever a solidão subjetiva, e também o objeto mais de gozar que se sustenta deste vazio e o tampona ao mesmo tempo”[6].
Lacan foi mais além do Édipo, e seu desejo era formar uma Escola, não uma sociedade. Por isso nela não há lugar para uma exceção, a do pai todo gozo. Reúne uma série de sujeitos divididos, cada um com seu próprio mais-de-gozar, cada um em sua solidão. Por esta razão, cada um traz em si a capacidade do ato.
Mais além do Édipo implica também que todos seus membros estão submetidos à solidão de sua relação com a Escola. Por esta razão, há uma inquietude, uma intranquilidade. Razão da proposição de que o analista não é indiferente porque a formação do analista não o protege do real. Alguma diferença para os dias que se seguem ao último “ano zero”.
[1] MILLER, J.-A. “Teoria de Turim: sobre o sujeito da Escola”. In Opção Lacaniana online Ano 7, N. 21, novembro 2016, p.12
[2] Idem
[3] MILLER, J.-A. Política lacaniana. Colección Diva, 1ª edição, p.25.
[4] MILLER, J.-A. Seminário de 24 de junho de 2017.
[5] MILLER, J.-A. Teoria de Turim: sobre o sujeito da Escola, p.8
[6] Idem.