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Interpretar a criança
Vamos, crianças!
A crônica de Daniel Roy*
Dorian não dorme. Seria porque Violette, recém-chegada ao mundo, ocupa o quarto dos pais? Seria porque a chegada da irmã em seu mundo provocou nele uma cólera legítima? Seria porque ela vem, talvez, ocupar um lugar deixado vago no desejo de seu pai e de sua mãe? É bem legítimo que a mãe de Dorian se faça essas perguntas e ao fazê-las pratica as primeiras interpretações que tentam alojar num discurso o acordar intempestivo de seu filho e sua grande agitação. Mas essas interpretações – sem dúvida alguma justas – não acalmam a criança, que apenas consegue se acalmar quando está só com sua mãe.
Dorian não dorme. Seria porque ele acabou de retornar à escola dita maternal – aquela onde, dixitLacan, procede-se a des-maternalização?
Seria porque, na escola maternal, «ele faz besteiras» com seu colega Félix e a professora lhe diz, «vá para o canto»? Entretanto, parece bom para Dorian ter um amigo com quem ir para o canto, e isso da professora lhe dar «um canto» para compartilhar com seu colega Félix, parece lhe agradar. Aqui, é a criança que fala e o que diz deixa ouvir que ela sabe encontrar lugares para se sentir apaziguada.
Ir para o canto não é uma sanção para ele, mas a marca de um interesse particularizado dessa senhora que se chama «mestra» e é com prazer que segue suas instruções – «todos os dias!», dirá sua mãe. Ele tem, portanto, outras soluções além da presença da mãe e elas não se excluem: Dorian é politeísta e nos faz ouvir que sabe reconhecer a presença das pequenas divindades alojadas em cada cruzamento significante.
Sigamos ainda seus passos no discurso, tal como se desdobra no encontro com seu analista. Por recomendação de sua mãe, ele me indica primeiro que tem medo «do eão grande», sintagma no qual não hesito em reconhecer sua interpretação pessoal do «leão grande»… Em seguida, reencontrando os objetos pequenos que deixou três meses atrás, separa dois: uma moto que não roda porque a roda está imobilizada pela areia; pequenas moedas que se esforça para fazer desaparecer na fenda d caixa de cartas, mas de dentro para fora.
Eis então Dorian com uma coisa que não funciona e outra coisa a mais, em excesso, que precisa fazer desaparecer. E dizem-lhe que ele não está certo de que «oeão grande» poderá tomar esse excesso a seu cargo, engolindo a criança e seus objetos. Há alguma coisa que prende. A «solução» fóbica não pode tudo! Há outras vias.
Então, levantemos aqui a hipótese de que interpretar esta criança é, primeiro, permitir-lhe permanecer o tempo que ela precisa nesta zona onde «o significante aparece como fenômeno elementar do sujeito»(1), fora do senso comum. Na verdade, eu não saberia separar o que Dorian quer dizer do que ele diz, separar o que ele quer fazer do que ele faz. Cabe a mim constatar essa eficácia do significante fora de qualquer «interpretação». Se eu não o faço, quem o fará?