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As diversas faces do suicídio¹
Fernando Prota (EBP/AMP)
A morte de um ente querido sempre abre uma fenda na experiência de vida de quem fica. A morte por suicídio abre uma cratera. O não sentido bruto que opera o ato deixa quem fica, e toda a sociedade, tomados por uma angústia que exige a tomada da palavra para que essa experiência possa ser humanizada.
Possibilitar um cerzimento de falas e vozes que pudessem entretecer relatos, hipóteses, manejos e angústias em torno do tema do suicídio, foi o que nos orientou a oferecer uma Conversação para o Conselho Gestor de Saúde Mental da Prefeitura de Ribeirão Preto-SP, quando este procurou a Seção São Paulo para solicitar um trabalho em torno da questão da prevenção ao suicídio, pela ocasião do setembro amarelo. Tal convite veio na esteira dos efeitos de conversações anteriores que já vêm marcando a presença da EBP Seção-SP na cidade, com seu modo particular de operar.
A comissão organizadora, habilmente conduzida por Silvia Sato, que também coordenou a mesa, trabalhou nessa costura nada fácil entre os discursos da psicanálise e da saúde mental, que ora convergem e ora se distanciam. O título “Diversas faces do suicídio” tenta contemplar esse enlaçamento.
Dois impasses clínicos disparadores foram produzidos e apresentados por profissionais da rede, cujos pontos mais vivos foram ressaltados por mim enquanto debatedor da mesa.
Falar de uma conversação é falar daquilo que ecoou para si. Os pontos que em mim ecoaram dizem respeito, inicialmente, ao espaço dedicado ao que foi denominado de “sobrevivente”. Penso que esse é um elo da cadeia de efeitos do ato suicida pouco enfocado nos debates sobre o tema. O caso trazido por Denise Ap. de Freitas, psicóloga, trouxe o caso de uma mãe que perde uma filha de 13 anos por um ato
suicida caracterizado pelo curto circuito, por ser uma “garota normal” que, de repente, frente a uma frustração mínima, se enforca no varal de casa.
O relato expõe a dificuldade em tantos casos de jovens que frente a uma “causa mínima” colocam todo o seu ser em jogo, num ato sem restos, cujo sem sentido assola quem fica. Denise nos traz todo o trabalho dessa mãe para lidar com o sem sentido, para “esculpir esse vazio”. Ressaltou-se a dimensão do tempo e da delicadeza nessa condução, assim como a função da culpa no luto.
A “causa mínima” ou a “frustração mínima” circulou pela sala em busca de falas que pudessem formular hipóteses que produzissem alguma espessura para essa questão, mas pouco pôde ser dito. Assim como a mãe “sobrevivente”, ainda estamos por dizer algo que possa nos amparar frente a esse ato que só é experimentado como desatino.
Outro caso, também um suicídio de uma garota de 13 anos, trazido por Heloisa Mian, psiquiatra infantil da rede, expõe outra face, a da morte que ronda a infância e a adolescência via desamparo social, familiar e precariedades mil. A rede de saúde municipal entra como suporte solicitado, mas não consegue fazer borda para o sujeito se ancorar. Neste caso, a pulsão de morte tem a face da agitação maníaca e de uma forma não menos mortífera. Uma colega psicóloga e tradutora, nos lembra que em alemão suicídio tem duas formulações: leben nehmen (tirar a própria vida) e Selbstmord (assassinar a si mesmo), nos remetendo a pensar a diferença entre desistir de viver e desejar morrer.
Lembrando-se de Torquato Neto, “menino infeliz” que se suicidou, uma voz na sala ecoa “Cajuína” e nos lembra que a matéria vida é tão fina e que nos cabe tentar, junto com nossos pacientes, tecer algo em nossa prática para que essa matéria, mesmo que fina, possa sustentar umas tantas vidas.
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1 N.R.: Atividade realizada dia 22 de setembro de 2018, em Ribeirão Preto. Parceria da EBP-Seção e Programa de Saúde Mental da PMRP.