BOLETIM ELETRÔNICO DAS XI Jornadas da EBP - Seção São Paulo Local das Jornadas: Meliá…
Editorial #02
EDITORIAL – BOLETIM INTER-DITO #2
Veridiana Marucio
Membro da EBP-AMP
São diversos os momentos no percurso de Lacan em que ele se dirige aos jovens. Poderíamos até nos perguntarmos se todo o seu ensino não foi inicialmente dirigido aos jovens, preocupado como ele se manifestava com o futuro da psicanálise.
Para ele, o que constitui a juventude é a relação com o saber, muito mais do que a idade. De fato, nenhum sinal de uma fantasmatizacão da juventude em Lacan. Seguindo suas palavras, o momento da juventude se refere a um despertar, a isso que faz furo no saber[1]. Talvez pudéssemos dizer que ele se dirige aos jovens, um a um.
O nosso segundo boletim Inter-dito traz, assim como o argumento das XI Jornadas da EBP-SP, esse despertar, contando com 5 textos produzidos por jovens, que nos apresentam suas reflexões e questões, fruto da provocação feita pelos coordenadores da comissão de boletim.
Tomamos emprestado o neologismo lacaniano Varidades para nomear a rubrica onde serão publicados os textos produzidos por nossa comunidade de trabalho. Apresento a seguir os que foram produzidos para esta edição:
Verdade e real em João Guimarães Rosa
Em seu Ensino e em seus Escritos, Lacan convocou a escrita poética e literária para fazer surgir, na concretude de uma atualização, a especificidade da relação da verdade com o significante e com a letra.
O primeiro texto da série Varidades é também uma convocação trazida por Elisangela Miras através da novela Conversa de bois de João Guimarães Rosa. Elisangela traz como ponto de virada da novela, ou ponto de poesia, como ela mesma nomeia, a inserção na narrativa das homofonias, elipses, onomatopeias e neologismos.
O que nos evidencia esse trabalho é que a escrita poética revela que a linguagem não é informação, mas sim ressonância que se sobrepõe à matéria que liga o som e o sentido. Essa escrita desvela e revela aquilo que Lacan chamou de moterialismo. Muitas questões podem ser levantadas e trabalhadas a partir desse belo texto.
Verdade, de um lugar (a) Outro
Paula Maia parte em seu texto do deslocamento da discussão da verdade da tradição do pensamento filosófico para o campo da psicanálise. A verdade revela-se, segunda a autora, complexa por definição por ser indissociável da linguagem. A seguir, extrai e destaca do curso de Jacques Allain-Miller A Natureza dos Semblantes duas das seis qualificações da verdade escritas por Lacan.
Finaliza com uma questão clínica e política, também nos fazendo refletir e avançar nos conceitos que se articulam de forma inédita no ultimíssimo ensino e Lacan.
O truque do sonho
Cynthia Gonçalves Gindro nos propõe em seu trabalho aproximarmos três conceitos. Diz ela: uma aproximação entre a verdade, o gozo e o sonho me pareceu interessante.
Apoia-se em J-A. Miller e em sua afirmação de que existem sonhos que podem apresentar o gozo não pela via ficcional que o interdita, mas pela via do gozo como acontecimento de corpo; O sintoma se torna a partir desse momento ligado a incidência da língua sobre o corpo.
A autora se refere às invenções do parlêtre como um truque, algo que todos inventam para preencher o furo, frente ao trauma do sem sentido, onde não há relação sexual. Vale a leitura para a acompanharmos em suas aproximações clínicas e na direção política que ela nos propõe.
De uma mentira verídica à verdade mentirosa
No final de uma análise já não se trata mais de interpretação e o dispositivo do passe, segundo Lacan, é destinado àqueles que se arriscam a testemunhar da melhor maneira possível sobre a verdade mentirosa.[2]
Andressa Contó Luz inicia seu trabalho se perguntando sobre esse momento de conclusão e sobre o limite da ilusão da verdade que se fez presente durante todo o percurso de uma análise. De que satisfação se trata aí?
Andresa encontra em Miller uma direção e nos propõe alguns caminhos, abrindo ainda para outras questões. A autora nos apresenta um texto aberto e instigante, rico em referências e formulações. Seguimos com ela seu working progress.
Sensível à palavra
Élida Biasoli inicia seu trabalho com um relato de uma experiência pessoal vivida enquanto estagiária de psicologia. Um momento de angústia produz uma virada em seu percurso como praticante.
Esse deslocamento subjetivo produz uma questão sobre o deslocamento que se opera na análise – do inconsciente estruturado como uma linguagem para a dimensão do real, para aquilo que escapa ao sistema da linguagem. Um trabalho que evidencia a maneira que Miller enodou a questão da interpretação no último ensino de Lacan ao sintoma de forma decisiva.