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“De cabeça erguida”, ou… da posição de objeto para a possibilidade de assunção de um sujeito
O filme que abriu o festival de Cannes 2015, “De Cabeça Erguida”[1] (França, 2014), foi exibido e discutido em Atividade Preparatória das Jornadas da Seção-SP Paulo no CINECULT-USP Ribeirão Preto, no dia 18 de maio[2]. Os comentários ficaram a cargo de Fernando Prota (EBP-AMP).
Da cena inicial do filme – em que Malony, aos 6 anos, escuta a voz de sua mãe e se vê, calado e cabisbaixo, ser deixado por ela na sala da juíza, lugar da lei – até a cena final – aos 17 anos, em que a diretora sugere que, imbuído da paternidade em suas mãos (Malony se torna pai), o sujeito opte por se descolar do lugar de objeto em resposta à falência do pai – a sala da justiça representa um lugar de suspensão no caminho do sujeito, de falência da inscrição paterna, que fixará Malony como objeto largado. Girando em torno desse lugar fracassado e endereçando ao pai, encarnado na equipe da vara da família, o sujeito, cheio de contradições e atuações, faz um intenso trabalho de transformar sua fixa resposta “sou um objeto abandonado” em uma questão sobre o ser.
O trabalho e a implicação corpo a corpo da equipe da vara da família (juíza, educador, assistente social, dispositivos de socialização etc.), amparada pela ficção do discurso do direito, sustenta uma possibilidade de suplência, de instauração de algo do simbólico para que o sujeito possa se desenrolar desse lugar de suspensão do laço.
Fernando Prota retoma Philippe Lacadeé[3] para destacar a contribuição desse filme para o tema da adolescência. Malony não é um adolescente típico, mas traz pontos radicais pertinentes a esse momento de reencontro com o real pulsional do corpo.
O sujeito adolescente testemunha que o lugar do infans ocupado até então na família não funciona mais tão bem. Então, a saída é para o mundo, em “busca da verdadeira vida”[4], que exige necessariamente uma separação do Outro familiar, uma subversão.
Nesse ponto é que a errância e as passagens ao ato geralmente tomam lugar na vida do adolescente.
Para Malony, no entanto, a subversão é sinônimo de atuação (no sentido de repetição), tornando-se seu modo de ser. De qual subversão se trata se o outro familiar de Malony o toma do lugar de objeto, ou seja, ele não encontra ali um lugar simbólico, não podendo se perguntar sobre seu lugar para o Outro? A subversão, então, não está em relação ao Outro, podendo abrir caminho para a assunção do sujeito, mas sim para revelar a não incidência desse Outro e, ao mesmo tempo, fazer um apelo a este. Ao mesmo tempo em que rechaça, Malony apela ao Outro.
Esse apelo passa a ter endereço a partir do encontro com profissionais da vara da infância que decidem não recuar diante dos “pedidos de abandono” de Malony. A partir da sustentação de um árduo e nada ideal trabalho de suplência, Malony pôde experimentar, pelo menos um pouco, um novo laço, que por sua vez, tornou possível a ele aceder a uma novidade que não poderia se dar sem um esboço de assunção da falta: o amor. Somente então é que, “de cabeça erguida”, e não mais como um objeto acuado que, cabisbaixo, se vê deixado, é que Malony olha para fora da sala de justiça e pode tentar caminhar com suas próprias pernas.
Por Fabiola Ramon (para a Comissão de Boletim)
[1] Filme dirigido por Emmanuelle Bercot, estrelado por Catherine Deneuve, Rod Paradot e Benoît Maginel. [2] Cinecult-USP RP é uma atividade coordenada por Eduardo Benedicto (EBP-AMP) e Mauro Moura Mohan. Acontece no auditório da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto- USP. [3] Lacadée, P. (2011). O despertar e o exílio. Rio de Janeiro: contracapa, 2011. [4] Termo usado por Philippe Lacadée.