BOLETIM ELETRÔNICO DAS XI Jornadas da EBP - Seção São Paulo Local das Jornadas: Meliá…
O COGITO LACANIANO E O CORPO QUE SE GOZA, SOB A PERSPECTIVA DO PARLÊTRE
Cynthia Gonçalves Gindro
Associada ao CLIN-a
Jacques Lacan, em R.S.I., traz o neologismo que condensa a fala e o ser, traduzido para o português por falasser. Chama-me a atenção o lêtre, quando escrito parlêtre, pois parece pôr em evidência a relação do falante com a letra quando se fala.
Para que essa ideia se esclareça, recorro à referência de Jacques-Alain Miller[1], quando ele cita uma localização do gozo articulado em um dispositivo significante, apontando para o que do gozo pela via significante também tem marca no corpo. Miller[2] esclarece mais sobre esse ponto, trazendo a ideia da substância gozante. Há um estatuto do corpo como corpo de gozo, e que isso não impede que esse gozo se condense em partes do corpo.
Interessa-me tanger essa condensação de gozo em partes do corpo, que só me parece possível com a marca de lalíngua, trauma da marca de gozo que se faz com uma extração da substância gozante pela língua, pelo encontro entre corpo e linguagem. Nessa junção causada por esse encontro traumático entre corpo e língua, pode-se dizer que causa uma localização de gozo articulado à palavra, dando corpo às letras necessárias para um fantasma se inscrever.
Miller[3] claramente diz: “a busca pelo fantasma fundamental é um suporte válido da investigação no marco da verdade mentirosa”. Com isso, surge cada vez mais a aproximação entre fantasma e sintoma, justamente nesse ponto de gozo do corpo articulado ao significante traumático.
Aparece aqui também o que se chama de “efeito significante”, o modo particular como o significante privilegiado de lalíngua afetará o corpo de cada um. Éric Laurent, diz: “a partir de 1970 Lacan vai deduzir a relação com o corpo a partir da certeza de gozo que o furo dá ao corpo”[4].
Um longo caminho a se percorrer, mas o que me parece bastante chamativo nessa articulação é, como bem marca Lacan: “Lalíngua nos afeta primeiro por tudo que ela comporta como efeitos que são afetos. Se se pode dizer que o inconsciente é estruturado como uma linguagem, é no que os efeitos de lalíngua, que já estão lá como saber, vão bem além de tudo que o ser que fala é suscetível de enunciar”[5].
Ou seja, seria com essa ideia dos efeitos de afetos que lalíngua produz, que poderia nos servir de direção de tratamento. Já que, a partir dessa perspectiva, podem surgir perguntas e problemas para a constituição subjetiva e o problema do final de análise. Porém, apesar de, em uma análise, o caminho ser inverso ao da constituição subjetiva, ainda assim uma direção do tratamento se extrai, ao interrogar: seria, então, com os efeitos de afetos, que um modo de gozo pode se tocar e localizar nas letras ao longo de uma análise? E esse modo de gozar pode se modificar ao final com a constituição de um sinthome?