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Raízes Literárias da Psicanálise III: “Experiência e não-saber em George Bataille” – Conferência de Marcelo Jacques de Moraes.

Reflexões de Sonia Carneiro Leão

“Bataille com Lacan”

 

Georges Bataille trabalha pelo avesso. Fala do informe, do impossível, do não sentido, do não saber e do êxtase que, segundo ele, é a possibilidade de transformar angústia em delícias.

Como qualificar Bataille? Um filósofo? Um santo? Um louco? Foi chamado de inqualificável.

Uma pergunta sempre ficou no ar. Por que Lacan só se referiu a ele em uma única nota de rodapé nos Escritos, apesar de ambos terem tido uma relação bem próxima?

No seminário Encore, por exemplo, Lacan trabalha questões em torno do absoluto, de Deus, do amor, do gozo, da mística, do significante que faz furo no Outro. Todas essas questões aparecem como tema principal no romance de Bataille, “Madame Edwarda”.

O próprio título do seminário, Encore, costumam dizer, pode ter sido inspirado a Lacan a partir da fala da personagem Edwarda, a mulher que não consegue pôr fim ao seu gozo e pede sempre mais, ainda.

No seminário Encore, Lacan fala assim: Eis aí o que se diz para aquilo que é do gozo quando ele é sexual. O gozo é marcado de um lado por esse buraco que não lhe assegura outra via senão a do gozo fálico. Será que do outro lado algo não pode ser atingido, algo que nos diria como aquilo que até então somente falha, abertura no gozo, seria realizado?

Bataille não se refere ao gozo. Fala em êxtase. Se o gozo é marcado pela falta, o êxtase é marcado pelo excesso. Um mais, ainda?

Para Bataille, há aquilo que ele chama de uma experiência levada ao extremo do possível. E isso tem consequências. Essa experiência se dirige ao não saber. E, segundo Bataille, o não saber comunica o êxtase.  Para ele, o não saber é antes de tudo angústia. Bataille é um defensor da angústia. Sua obra literária gira em torno da angústia. A experiência ao extremo do possível é denominada por ele de suplício. Carrega em si autoridade e promove o sujeito soberano, o sujeito não referido ao saber, já que está atrelada ao desconhecido.

E disse Bataille: “Arruíno em mim tudo o que se opõe à ruína. O homem insípido é fraco, incapaz de se dilacerar. Fugindo da angústia chegamos à pobreza vazia. Eu não sou só. Eu me sei o reflexo da multidão e o somatório de suas angústias. A experiência interior é conquista e, como tal, para outrem. Todo ser humano não indo ao extremo é servidor ou inimigo do homem. Não consigo conceber a minha vida senão ligada ao extremo do possível. O extremo é o único ponto por onde o homem escapa de sua estupidez limitada, mas ao mesmo tempo nela soçobra .Ir ao término significa pelo menos isso: que o limite, que é o conhecimento, o saber como fim, seja ultrapassado”.

Para Bataille, a experiência ao extremo do possível leva à fusão do objeto e do sujeito, sendo o sujeito o não saber e objeto o desconhecido.

Bataille cita São João de Cruz, aquele que caiu nas trevas do não saber numa experiência mística contemplativa que, diferente do gozo,  não demanda satisfação.

E trago aqui o poema desse religioso, “Coplas sobre um êxtase de alta contemplação” para concluir esta apresentação.

Entreme donde non supe

Y quedeme no sabendo

Toda a ciência transcendendo

Toda a ciência transcendiendo.

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