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A vida (não) é um sonho: real e surpresa na psicanálise

Tatiane Grova Prado – Coordenação Geral
Marcia Zucchi – Coordenação Epistêmica

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As Jornadas Clínicas da EBP-Rio e do ICP-RJ foram realizadas nos dias 29 e 30 de novembro no Hotel Prodigy, no Aeroporto Santos Dumont. Espaço bastante agradável, com linda vista para a Baía da Guanabara e farto em restaurantes em seu entorno, mais especificamente no Bossa Nova Mall.

A proposta da Diretoria da EBP-Rio neste ano foi de que as Coordenações, Geral e Epistêmica, pudessem acompanhar, juntas, toda a construção das Jornadas de maneira a garantir uma unidade epistêmica ao conjunto do trabalho, e o resultado desta prática foi bastante bom.

O título escolhido foi: A vida (não) é um sonho: real e surpresa na psicanálise. Os eixos temáticos definidos foram: Eixo 1: Sonho, desejo e gozo. A prática do analista hoje. Eixo 2: O sonho e sua interpretação. Sonho que adormece e o sonho que desperta. Eixo 3: Corpo que se sonha. Sintoma, Significante e gozo. O que se escreve no sonho? Eixo 4: O trabalho com o sonho na psicose. Da clínica privada à rede pública.

As Comissões foram as seguintes: Comissão Científica, Divulgação e Mídias, Infraestrutura, Tesouraria, Livraria, Acolhimento, Secretaria e Festa.

Recebemos dois convidados internacionais: Mauricio Tarrab (EOL) que nos brindou com uma bela conferência, além de um meticuloso trabalho de análise dos casos apresentados na Conversação dos Núcleos do ICP; e Alejandro Reinoso (NEL), AE em exercício que, além de também comentar os trabalhos da Conversação dos Núcleos do ICP, fez seu depoimento de Passe. Agradecemos imensamente a gentileza e precisão da participação de ambos.

O trabalho de preparação para as Jornadas se deu através do envolvimento de toda a nossa comunidade. Tanto através de pequenas produções de textos, vídeos ou comentários de textos — que foram sendo publicados no site das Jornadas, no Facebook e no Instagram — como pela participação dos colegas nas diferentes Comissões e nas diversas atividades realizadas na Seção e no ICP em torno do tema das Jornadas.

As Jornadas se estruturam em torno de algumas atividades: duas Plenárias que foram pensadas como momentos de aprofundamento dos conceitos presentes no título das Jornadas; duas “Rodas de Conversa” que foram organizadas no sentido da extensão e dos intercâmbios da psicanálise com a cultura e com a cidade; uma manhã de “Mesas Simultâneas”; e as atividades já mencionadas com os convidados internacionais. Tivemos também uma homenagem ao colega Fernando Coutinho que nos deixou em 2019.

Além dos convidados internacionais, recebemos também como convidados Marcus Faustini e Joana Collier. Na primeira Roda de Conversa, cujo título foi “Sonhos, pesadelos e despertares na cidade”, Marcus Faustini, teatrólogo, idealizador e coordenador da Agência Redes para a Juventude, nos falou de sua metodologia para levar jovens da periferia do Rio de Janeiro a encontrarem modos de fazer redes na cidade visando a realização de seus projetos. Recebemos ainda, na segunda Roda de Conversa, que teve como título “O sonho na literatura, no cinema e na psicanálise”, a cineasta e montadora Joana Collier, que nos presenteou com um extrato de um filme montado por ela, além de uma apresentação sobre o tema da montagem como o que desvela o desejo e as fissuras presentes nos filmes. Na fala de Joana, encontramos várias consonâncias entre seu fazer na montagem dos filmes e a prática dos analistas com os sonhos.

Consideramos as XXVI Jornadas um êxito pela qualidade do trabalho realizado seja na sua organização, seja na execução através das contribuições práticas e teóricas de todos os colegas.

Finalizamos esse evento com uma linda e animadíssima Festa: “Acorda Amor”, que aconteceu no Spaço Fractal.

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A vida (não) é um sonho: Surpresa e real na psicanálise

Por Andréa Reis Santos

Apresentação

Nas Jornadas deste ano, que vão acontecer nos dias 29 e 30 de novembro, e serão as  XXVI da Seção Rio em parceria com o ICP vamos trabalhar em torno do tema do sonho, de maneira muito conectada ao que propõe o XII Congresso da AMP, que acontecerá em abril de 2020, e que tem como título O sonho, sua interpretação e seu uso no tratamento. Nem sempre é assim que acontece e espero poder dizer duas palavras aqui sobre o que motivou a escolha de um tema tão próximo ao do Congresso.

À primeira vista, caso seja lido muito rapidamente e associado à forma de interpretar os sonhos que deu origem à psicanálise, esse pode parecer um tema antigo, coisa de outra época. Da época em que era possível provocar efeitos de surpresa e mudanças subjetivas a partir dos deslocamentos de sentido produzidos pela interpretação do analista. Seria esse apenas um retorno? (não que os retornos sejam desnecessários. Recentemente Romildo em um vídeo gravado para o site das Jornadas falou disso: da importância de fazê-lo de tempos em tempos). Ainda assim pergunto: seria esse somente um retorno, um assunto um pouco ultrapassado, que correria o risco de nos fazer dormir?

O que temos escutado e lido sobre esse tema a partir do debate em torno do Congresso da AMP demonstra o contrário, demonstra que colocar a conversa sobre a prática da psicanálise em primeiro plano, o dia a dia da clínica de cada um, partindo da perspectiva do sonho, pode ser uma forma muito eficiente não só de retomar a força do texto freudiano, mas de articular diferentes momentos do ensino de Lacan para pensar como a psicanálise se arranja com as demandas atuais, com o que surge de novo na clínica,  e com os sintomas da época.  Pensar de que maneira o uso do sonho na sessão é capaz de produzir deslocamentos, de acessar o real em jogo numa análise por outras vias que não a da interpretação dos tempos de Freud é uma questão muito atual, muito viva.

Responder ao mal estar que se endereça à análise pela via da interpretação do sonho hoje é quase uma ação política. É mais do que conduzir até o inconsciente – até porque com Lacan aprendemos que o inconsciente não é só lugar, mas também tropeço -, é uma forma de fazer existir o Inconsciente. O analista hoje é aquele que dá valor e lugar ao tropeço, aquele a quem cabe fazer existir o inconsciente. E renovar a pergunta sobre como fazer isso em função da subjetividade da época é tomar partido da psicanálise. Essa é a política da psicanálise que nos interessa e que vivifica nossa prática. Resta saber como fazer, ou já fazemos e resta dizer como.  (É assim que fala Miller a respeito da análise do falasser).

Foi por isso, por essa vitalidade, que decidimos puxar um fio a partir do tema do Congresso da AMP para orientar não só o tema das Jornadas, que vão acontecer em novembro, mas também de boa parte do trabalho que se faz na Seção Rio ao longo do ano. A vida (não) é um sonho: Real e surpresa na psicanálise propõe pensar de que forma o uso do sonho, do seu relato, pode favorecer o efeito de surpresa que a presença do real é capaz de produzir na experiência de uma análise.  Como se interpreta hoje quando a produção de sentido já não é suficiente, não tem o mesmo efeito disruptivo, de estranhamento, que tinha em outros tempos? Como fazer da sessão um lugar onde o encontro com aquilo que do sonho aparece como fora do sentido, que irrompe na narrativa, consiga, em alguns momentos, produzir instantes de despertar que levem a uma reconfiguração subjetiva?

Produzir um debate que seja capaz de extrair consequência destas perguntas é uma empreitada que envolve muitos agentes. Tatiane Grova Prado, como coordenadora geral, e Marcia Zucchi, como coordenadora epistêmica das Jornadas, já se colocaram a trabalho há quase um ano, mobilizando muitos colegas em torno de um mundo de tarefas para que as nossas Jornadas sejam ocasião de trabalho rico e de muitas surpresas. Elas assinam o argumento publicado no site das Jornadas, onde é possível ler a riqueza que se extrai dessa articulação entre vida e sonho, dormir e despertar, que o título provoca. A vida como ficção é sonho que embala e faz dormir, enquanto o sonho traz em seu relato um tanto de real que irrompe, perturba o sono e acorda para outra forma de estar na vida. Esses elementos que fazem parte do nosso tema também estão presentes no belo cartaz que foi feito por Bruno Maron a partir do que elas, Tatiane e Marcia, junto à coordenação de mídias, Cristina Frederico e Anna Luiza Almeida, souberam transmitir a ele. Vale a pena prestar atenção a cada detalhe da cena que o cartaz ilustra.

Para enriquecer a conversa sobre essa aposta no poder da psicanálise de renovar sempre o modo de pensar sua prática, de insistir na busca pelas vias inéditas que permitem manter a sua potência, convidamos para vir ao Brasil nosso colega da EOL, Mauricio Tarrab. Estamos muito contentes em contar com a presença dele nestas Jornadas. Também teremos aqui o privilégio de escutar o testemunho de passe de Alejandro Reinoso, da NEL, para pensar com ele sobre o lugar e o uso do sonho no seu final de análise e o que isso ensina a respeito do sonho nos outros momentos de uma análise.

Até lá temos muito trabalho pela frente. Parte das atividades da Seção Rio já se movimenta nessa direção, entre elas o Seminário do Passe, sobre “O sonho e as paixões” coordenado por Ana Lucia Lutterbach, que teve início há duas semanas atrás com uma apresentação de Cristina Duba sobre uma aula de Miller no Seminário Política Lacanina que serviu de ponto de partida para um debate sobre o passe clínico e o institucional. A partir do segundo semestre Ana Lucia vai conversar com seus convidados, AEs e ex-AEs, que virão nos contar sobre a  função do sonho nos seus testemunhos de passe. Já estão confirmados Marina Recalde (EOL),  Irene Kuperwajs (EOL) e Rachel Cors (NEL).

No Seminário Clínico, Marcus André Vieira e Romildo do Rêgo Barros estão trabalhando em torno do sonho na sessão de análise a partir da perspectiva do tempo: incluir o tempo para poder pensar sobre a incidência do sonho na dimensão real do espaço. Considerar o tempo fora da lógica da duração e tomar o sonho como suspensão, ruptura da cadeia, permite pensar a interpretação lacaniana menos como associação de sentido e sim como espaço de irrupção. A importante transmissão que Marcus e Romildo vêm fazendo ali reverbera sobre o que está sendo produzido em torno do tema do sonho na Seção, certamente servirá de bússola para o trabalho que temos pela frente até novembro, e orientou grande parte do que está sendo dito nesse texto.

Todo esse movimento parte da aposta de que a psicanálise é um jeito de saber fazer com a presença do que desacomoda e desperta, um jeito de fazer que contribui para que a vida não seja absorvida pelo desejo de dormir. A psicanálise insiste em querer saber sobre o que atiça a vida.  Se o sonho ainda nos interessa é justamente porque carrega nele essa presença, que não se deixa agarrar pela interpretação do sentido como em outros tempos, mas que ainda assim está aí nos desafiando a buscar maneiras de tocá-la. Ainda temos muito trabalho pela frente e vocês todos estão convidados a participar dele.

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Apresentação das XXVI Jornadas Clínicas da EBPRio e ICPRJ

Comissão Epistêmica

Marcia Zucchi – Coordenação epistêmica

 Agradeço o convite das diretoras Andréa Reis e Paula Borsoi para que eu me ocupasse da Coordenação Epistêmica das Jornadas, e à Tatiane Grova por topar a parceria.

Uma palavra sobre a novidade na constituição dessa Coordenação: a proposta da diretoria foi de uma coordenação epistêmica que acompanhasse todo o processo de organização das Jornadas junto a Coordenação Geral das Jornadas. A parceria com Tatiane Grova é excelente, e os resultados desse formato novo ainda iremos avaliar ao final do processo.

Agora uma palavra sobre o “epistêmico” desta coordenação. Uma rápida pesquisa no Google nos mostra como a absorção desse termo na nossa língua se associou a conhecimento, o que de fato é bastante restrito, considerando-se que sua origem em Platão, em par/oposição com a “doxa” (opinião), fala mais do “conhecimento verdadeiro”. Mas acho que prefiro aqui a definição foucaultiana da epistême como paradigma geral que estrutura os saberes ou práticas discursivas de uma época”.

O que seria então uma coordenação epistêmica, no caso das Jornadas?

Assim, de um modo absolutamente reduzido, penso que uma coordenação epistêmica não visa e nem parte de nenhum “conhecimento verdadeiro”, já que este não há, mas busca, sim, certa integração das diferentes práticas que envolvem a produção de um evento como as Jornadas Clínicas, em torno de um tema como esse: “A vida (não) é um sonho: real e surpresa na psicanálise”, bem como o uso dos elementos da época para gerar esse acontecimento ‘Jornadas Clínicas’.

Nesse sentido, o que vimos fazendo é tentar participar de modo bastante próximo do trabalho das Comissões. Muito especialmente da comissão de divulgação e mídias, na produção do site e boletins e temos buscado, também, envolver boa parte de nossa comunidade no trabalho de pensar e produzir sobre esse tema da surpresa e do real no sonho, seja através da produção de textos, da pesquisa bibliográfica, de entrevistas e de comentários, que vocês, a partir de agora, poderão acessar em nosso site e no Boletim Vespa[1].

Num primeiro momento, além das colegas Angélica Bastos, Cristina Duba, Gloria Maron, Maria Silvia Hanna, Ondina Machado e Sandra Viola, que formam a Comissão científica propriamente dita, convidamos as diretorias da Seção e do ICP e a coordenadora geral das Jornadas, para comporem a comissão epistêmica ampliada e com elas pensamos o tema, o título, bem como os 4 eixos temáticos. A partir daí realizamos o trabalho de produção do argumento geral e dos argumentos por eixo que vocês encontram no nosso site.

A partir de agora, a Comissão Científico-Epistêmica propriamente dita vai trabalhar na organização da programação das Jornadas e da manhã de mesas simultâneas.

A escolha do tema relativo ao sonho para as XXVI Jornadas da EBPRIO e ICPRJ se deu em articulação ao trabalho que as Escolas da Associação Mundial de Psicanálise vêm fazendo em direção ao XII Congresso da AMP, cujo tema é: O sonho: sua interpretação e seu uso no tratamento lacaniano.

A perspectiva que nos pareceu interessante para convidar ao trabalho a nossa comunidade especifica, aqui do Rio de Janeiro, diz respeito, à surpresa e ao real no sonho e como isso se apresenta na clínica psicanalítica, hoje. Ainda se crê que um sonho porta mensagens cifradas? E nós, analistas, somos ainda convocados a decifrá-las nas análises? O sonho mantém-se como a via régia do inconsciente?  Como se dá o trabalho do sonho e com o sonho na psicanálise atual? Haveria uma função especial dos sonhos no final das análises? Do ponto de vista social, por outro lado, nesse tempo onde a realidade cotidiana se tece em práticas de ódio desveladas, será que a idéia de sonho associada ao desejo ainda se sustenta? Com quê as pessoas sonham? A perspectiva lacaniana de que despertamos para continuar sonhando, responde melhor às coordenadas da contemporaneidade?

Outro aspecto que nos pareceu importante abordar foi a clínica das psicoses. Se o neurótico sonha em análise em função da “outra cena” onde seu desejo vige pra além do recalque, qual o papel do sonho nas psicoses e como os analistas vêm trabalhando com os relatos de sonho de seus pacientes psicóticos, seja na rede publica, seja na clínica privada?

Bem, estas e muitas outras questões estão aí para que possamos nos debruçar sobre elas…

Nosso título, A vida (não) é um sonho: surpresa e real na psicanálise, ancora-se na discussão estabelecida por Lacan, no Seminário 11, quando, numa referência ao título da obra de Calderón de La Barca, La vida es sueño, discute a importância do real que se apresenta envelopado pelo sonho. Nesse sentido, Lacan distingue o caráter puramente ficcional da vida, apontando para esse núcleo de real que vemos apresentado em Freud pela noção de “umbigo do sonho”.

Por outro lado, se a vida não é pura ficção, se ha real mesmo no sonho, diferente do que preconiza o mestre moderno com a ideia de transparência absoluta, a psicanálise sabe que mesmo no simbólico há um limite quanto ao que se pode dizer, há um real. Esse real, porém, é singular, não universalizável, e é relativo ao modo como a linguagem despertou cada corpo, produzindo ali um gozo. O encontro desta experiência advém na análise como acontecimento contingente, como surpresa. Então, sonha-se no e com o corpo.

Assim, distinguimos 4 eixos temáticos para essas Jornadas :

  • Eixo 1: Sonho, desejo e gozo. A prática do analista hoje.
  • Eixo 2. O sonho e sua interpretação. Sonho que adormece e sonho que desperta.
  • Eixo 3: Corpo que se sonha. Sintoma, significante e gozo. O que se escreve no sonho?
  • Eixo 4: O trabalho com o sonho na psicose. Da clínica privada à rede pública.

Como se pode ver há pontos de conexão e pontos de distinção nos eixos e isso servirá à Comissão Científica para melhor distribuir os trabalhos na montagem das mesas.

Aproveito para já informar que o período de entrega dos trabalhos será de 10 de agosto a 10 de setembro para podermos ter tempo de preparar as mesas com o cuidado necessário para possibilitar que aconteçam boas discussões.

Os detalhes das normas para os trabalhos vocês receberão dia 17 de julho.

Creio que o conjunto do trabalho dessa Comissão e a nova proposta da diretoria se poderá avaliar melhor num “só-depois”, pelos trabalhos que forem enviados, pelas discussões que se produzirem e pelo saldo de saber que pudermos extrair de toda essa nossa “festa de produção epistêmica” que são as Jornadas anuais da Seção e do ICP.

Contamos com o mergulho animado de todos vocês nessa festa!


[1] WESPE –  letra do nome do Homem dos Lobos Sergey Pankejeff, que, no nosso caso, foi deslizando para vespa com seu zunido sem sentido mas que surpreende e desperta.
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