Breve comentário tecido, a convite da Diretoria da Seção-Rio, sobre os textos de Romildo do…
Comentários sobre o Seminário de Orientação Lacaniana
Na segunda noite do Seminário de Orientação Lacaniana (SOL) de 2019, seguindo com o tema “O psicanalista e as Paixões”, trabalhamos o Seminário/Conversação de Miller, “La transferencia Negativa”, que aconteceu em Madrid em 28 de novembro de 1998. Stella Jimenez apresentou sua leitura desta Conversação e Paula Borsoi se encarregou dos comentários. Esta noite de trabalho aconteceu na EBP – Seção Rio no dia 6 de maio de 2019, data significativa em que se comemorava os 163 anos do nascimento de Freud. E, além disso, se celebrava os 19 anos da inauguração da Escuela Lacaniana de Psicoanalisis (ELP), Escola espanhola da AMP, cuja estruturação começou justamente na experiência de trabalho coletivo que foi este Seminário/Conversação de Miller.
Em sua apresentação, Stella sublinhou que a transferência negativa é um tema infinitamente vasto e pouco trabalhado. Partindo da frase de Lacan: “Devemos, no entanto, pôr em jogo a agressividade do sujeito a nosso respeito já que essas intenções, como sabemos, compõe a transferência negativa que é o nó inaugural do drama analítico”, destacou que dela surgem várias questões, das quais optou por trabalhar “o que é pôr em jogo a transferência negativa”?
Stella percorreu alguns momentos do ensino de Lacan onde este ainda supunha a possibilidade de se interpretar a transferência negativa. Sublinhou, no entanto, no seminário 11, que Lacan associa a transferência negativa ao fato do sujeito “não tirar o olho de cima do analista”, o que Miller modaliza, nesta conversação, como “suspeita”. A suspeita estaria na base do trabalho psicanalítico. A afirmação de Lacan que a “transferência negativa é o drama inaugural da experiência analítica” se explicita como a presença de uma intenção malévola do lado do analista, uma vez que toda interpretação supõe algum mal quando aponta a falta-a-ser do sujeito e a falta de saber também do lado do analisante.
Dentre os vários aspectos trabalhados, Stella destacou a resistência e o consequente fechamento do inconsciente como uma manifestação da transferência negativa. O objeto obturando o acesso ao inconsciente. Aí a interpretação se mostra ineficaz. A hipótese de Stella é que isto é mais compreensível se o objeto a for tomado na sua vertente de mais-de-gozar, do que como objeto causa de desejo. Para explicitá-lo, usou como exemplo o passe de Maria Cristina Giraldo.
O trajeto final de sua última análise, que conduz ao passe, se dá sob a condição de “não ser devastada pela analista”. No entanto, algumas contingências, bem como uma inevitável dose de mal-entendido, levaram-na a que se sentir devastada também por esta analista. A transferência negativa se instalou e o manejo da analista, acolhendo a tensão agressiva e esvaziando-se quanto ao saber, permitiu que a análise prosseguisse até seu final. A repetição do gozo da devastação no âmbito da transferência permitiu que a analista pudesse manejá-la (não interpretá-la) e extrair dela a positividade da continuidade da análise até seu final.
Passando ao momento dos comentários, Paula Borsoi destacou o fato da transferência negativa, além de levar ao fechamento do inconsciente, poder servir também como motor da análise. A questão de a transferência ser negativa ou positiva, para Lacan, a coloca do mesmo lado, isto é: do lado da suposição (ou dessuposição) de saber em relação ao analista. A resposta adequada será sempre a não resistência por parte do analista. Paula lembrou que o rechaço do inconsciente equivale ao fechamento do “momento de compreender”. Sublinhou ainda, que a questão fundamental é como manejar os excessos tanto da transferência negativa quanto da positiva.
A discussão foi viva e aspectos clínicos da maior relevância foram abordados: a resistência do lado do analista (Mirta Zbrum); o furo do lado do analista na demanda das associações (Ana Tereza De Faria Groisman); a retificação da consistência do Outro cruel pelo manejo da transferência negativa quando o analista sustenta o furo do seu lado (Maria Ines Lamy), a relação da preguiça e da transferência negativa com a pulsão de morte (Vicente Gaglianone); a instalação da transferência negativa quando o sujeito se vê como objeto de gozo do Outro (Maria Silvia Hanna); a disjunção entre semblante e real como fonte da transferência negativa (Paulo Vidal), dentre outras. Bela noite de trabalho que deixa frutíferos restos!
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