skip to Main Content

Editorial Boletim Modos de Usar n.3

Teresa Pavone
Diretora de Biblioteca da EBP-Seção Sul
Arte: Marinela Goulart

Apesar dos tempos que correm especialmente no Brasil, a EBP- Seção Sul continua através de seus membros e participantes fortalecendo suas bases na mais estrita relação com a causa analítica seguindo em seu trabalho fundado no desejo de saber, e participando dos avanços de nossa orientação lacaniana. Prova disso é a amostra e os comentários de alguns dos trabalhos que seguem nesse boletim, das atividades do primeiro semestre deste ano. Assim seguimos a explorar, investigar e demonstrar nossa prática situando a especificidade de nosso campo, sempre em defesa da democracia enquanto analista cidadão e na preservação da democracia interna de nossa comunidade, dispondo dos dispositivos que Lacan nos legou.

O primeiro texto de Louise Lhullier, atual diretora de nossa Seção, discorre sobre alguns aspectos do caminho da construção da Seção Sul segundo suas elaborações apresentadas em uma conversação da Seção Leste Oeste no primeiro semestre deste ano. Vale a pena a leitura para a reflexão da questão de como é possível dentro de nossa Escola manter a tão desejada democracia, quer dizer, ter como norte que “a exigência de nosso discurso seria não dominar”, mantê-la no plano de ter como seu agente o objeto a. Vocês encontrarão neste texto uma fina análise de como a nova geografia da EBP, proposta pelo Conselho e trabalhada desde 2018, inscreve-se na Orientação Lacaniana, no conjunto da Escolas da AMP e caminha a partir de seus impasses.

“Pode ser que tenha chegado o momento de reestudar os estatutos das Escolas do Campo Freudiano e introduzi-los a um aggiornamento democrático. A democracia, com efeito, não é apenas o poder da maioria, mas a proteção das minorias”.[1]

“A proposta da Nova Geografia da EBP surge, em 2018, no movimento do Conselho em resposta à convocação de JAM a ‘um novo começo, uma mudança, uma transfiguração, uma aufhebung [Aufiebun] de acordo com o termo de Hegel’.” E complementa: “Tudo começa sem ser destruído para ser levado a um nível superior.” [aula de 24/6/2017 – 1º. Parágrafo]”.

Em seguida o Boletim apresenta uma nota de Nohemí Ibanez Brown, presidente do Conselho da EBP-Seção Sul, destacando o tema: “O Ensino e o Ensinar como o fio condutor das discussões”, apresentações e conversações dos Seminários de Orientação Lacaniana ocoridos na Seção Sul. Ela nos conta quais as propostas sustentam o SOL (significante que ela refere como um significante carinhoso e que se sustenta no desejo de trabalho) para que o Seminário “tenha o valor de um feixe de luz. Que possa iluminar, elucidar no melhor dos casos, pontos que nos permitam sustentar a psicanálise como uma disciplina viva e pulsativa”. Desse modo, Nohemí nos conta: “…quando aconteceu a Grande conversação da AMP e a fala de JAM de encerramento que, como sabemos é mais bem de abertura, tocou na questão do ensino. A qual extraímos e problematizamos, dando lugar ao título do SOL deste ano: Há que distinguir ensino e ensinar. O que isso quer dizer? Como podemos situar o que aqui acontece a partir desse ponto?”. Nohemí frisa que os textos de base que tem sustentado os seminários que estão ocorrendo este ano “são as últimas duas lições do curso Todo el mundo es loco, mas não só, como temos visto ao longo das reuniões”.  O texto é um convite irrecusável ao trabalho!

Das Noites de Biblioteca ocorridas no primeiro semestre de 2022, Nancy Carneiro Greca segue com seus comentários afiados da primeira Noite de Biblioteca desse ano, cujo tema foi “O analista e a posição feminina”. Destaca aspectos importantes da fala da convidada Graciela Bessa que, inspirada por Miller, parte da ideia de que: “na impossibilidade de definir o que é um analista, inseparável de sua prática, Lacan o apresenta pelas vias do desejo do analista, do discurso do analista e do ato analítico”.[2] Ao longo de sua fala, localiza o desejo do analista como um desejo inédito, e tal como o feminino, da ordem da contingência, ambos abordados à luz dos conceitos de real, de vazio e de furo.

Gustavo Ramos apresenta comentários sobre o passe e a autoficção a partir do texto de Jésus Santiago: “A Escrita Real No Passe Não é Autoficção” que deu origem ao título da segunda Noite de Biblioteca. O trabalho primoroso e preciso de Jésus Santiago (AME EBP/AMP) teve o merecido destaque de algumas elaborações importantes principalmente no momento atual onde o passe está em questão, em “crise”. Jésus afirma que não haveria uma correspondência estrita entre os dados e os fatos da história do sujeito e a verdade da solução encontrada por esse mesmo sujeito. “Em outros termos, a verdade do final de análise não é dedutível dos fatos proeminentes da biografia de um sujeito.”[3]

Finalmente o último tópico do Boletim traz notícias da Diretoria de Cartéis e intercâmbios destacando seus eventos e com os comentários de Valéria Beatriz e de Diego Cervelin sobre a “Noite de Intercâmbios: Feminino e Violência”. As convidadas foram: Dra. Fernanda Martins (Uniritter) da aérea do Direito e Blanca Musachi (EBP/AMP). Do texto de Blanca Musachi, “Subversivo feminino”, Valéria destaca que o tema do feminino para a psicanálise foi referido enquanto: “alteridade e enigma, tanto para homens como para mulheres. […] alteridade radical, como diferença absoluta”. Já do lado do Direito, Diego Cervelin comenta do texto apresentado por Fernanda Martins (Doutora em Ciências Criminais pela UFSC e professora do curso de Mestrado em Direitos Humanos da UniRitter), fazendo uma leitura muito atenta, estratificada e pungente em torno dos modos pelos quais um sujeito – e, nesse caso, especialmente os corpos feminizados – são tratados pelo Direito do ponto de vista do “para todos iguais” e por uma leitura do ponto de vista do social e da dificuldade da individualização no tratamento dos casos que se apresentam à justiça.

Boa Leitura!


[1] Louise Lhullier citando Miller.

[2] Miller, J. A. El Banquete de los analistas. 1 Ed, Paidós. 2011.

[3] SANTIAGO, Jésus. A escrita real no passe não é autoficção. In: Blog do Passe EBP, p. 12. Inédito.

Back To Top