Licene Garcia A Comissão da Diretoria de Biblioteca da EBP-Seção Sul, nesta 7ª edição extraordinária…
O cartel como “máquina de guerra” e a formação do analista
Mauro Agosti
Adriana Rodrigues
A atual Diretoria de Cartéis e Intercâmbio da EBP Seção Sul elegeu como tema de trabalho “o cartel como forma de resistência ao mal-estar na cultura e a formação do analista”. A partir deste ponto várias questões nos surgiram, dentre elas: “a que tipo de mal-estar um cartel pode vir a fazer resistência?”. A fim de trabalhar esta questão convidamos Iordan Gurgel (EBP-BA) para uma Noite de Cartéis intitulada “O cartel como máquina de guerra e a formação do analista”.
Iordan, com uma gentileza e afetividade ímpar com nossa Seção, ao buscar no texto “A psiquiatria inglesa e a guerra”[1] as bases da proposta do cartel como esse lugar de resistência, enfatiza a crítica que Lacan faz ao privilégio da formação médica como condição ou favorecimento na formação em psicanálise na época, e o lugar de liderança e de mestria que acabava por se formar nesses contextos. Tratava-se de uma crítica nada velada ao funcionamento da IPA e seus didatas. E afirma que a invenção do cartel foi uma resposta “ao autoritarismo, à prática reacionária e à função dos didatas da IPA”. Somado a este conflituoso contexto, a invenção do cartel acontece numa proximidade temporal e subjetiva, segundo Iordan, “com os grupos de Bion na segunda guerra, mas também com o movimento universitário na Sorbonne dos anos 60, os GTU (Grupo de Trabalho Universitário) que faziam oposição aos professores, que preconizavam e praticavam as aulas magistrais. Este movimento antecedeu e determinou o maio de 68” [2].
Miller, no texto “Novas reflexões sobre o cartel”, de 1994, afirma que o cartel tal como descrito por Lacan, no Ato de Fundação (1964), “é uma máquina de guerra contra o didata e sua cambada”[3]. A proposta de Lacan em esvaziar a figura do líder não apenas contesta a lógica da mestria, mas acaba por se tornar um princípio em sua escola, o que aparece, sobretudo, no modo como organizou o dispositivo do cartel e o destaque central que este assumiu no trabalho de escola[4].
Lacan aposta na desconstrução da posição magistral ou de mestria como condição para sustentar a psicanálise como algo vivo e em movimento. Partindo dessas inspirações, pensou a função do Mais-Um com características que vão na contramão do lugar clássico do líder que busca a hegemonia e exclusividade do saber, definindo o Mais-Um como uma liderança tímida, modesta e necessariamente permutável. O desempenho adequado dessa função é o que potencializa o alcance do cartel como modalidade contingente para manter aberto o furo e causar desejo de saber a partir do traço de cada um, não sem os outros.
Longe da proposta de uma formação didática, o trabalho e a pesquisa teórico-clínica a partir do cartel visam a singularidade do percurso, onde a formação do analista esteja em consonância com as formações do inconsciente. Deste modo, a Escola se propõe como “base de operação contra o mal-estar na civilização” tendo no dispositivo do cartel “sua máquina de guerra”.
E é nesta perspectiva que fazemos o convite para a participação nas atividades desta Diretoria ao longo do ano de 2024. Sejam bem vindos!
- 20 de março – Procura-se Cartel
- 22 de maio – Noite de Intercâmbio
- 28 e 29 de junho – Jornada de Cartéis
- 07 de agosto – Noite de Cartéis
- 27 de novembro – Noite de Intercâmbio