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Editorial – Boletim Modos de Usar n.2

Teresa Pavone (EBP/AMP)
Mariana Zelis (EBP/AMP)
Reclining Figure: Circle – Henry Moore
Reclining Figure: Circle – Henry Moore

Esta é uma edição especial do Boletim Modos de Usar da Seção Sul por se tratar da publicação de três excelentes textos discutidos em uma conversação preparatória para o X ENAPOL na Noite de Biblioteca O Amor é um Seixo Rindo ao Sol[i] na Seção Sul. Essa noite de trabalho antecedeu o ENAPOL, ocorrido nos dias 09 e 10 de outubro de 2021 sob o tema: O Novo no Amor – Modalidades contemporâneas dos laços.

Os textos foram escritos por colegas que fazem parte das equipes de Biblioteca da Seção Sul: Diego Cervelin, Gustavo Ramos e Licene Garcia que participaram de grupos diferentes de conversação do X ENAPOL. Essa noite de Biblioteca teve uma conversação animada pela colega Ondina Machado (EBP/AMP) da Seção Rio de Janeiro que nos trouxe valiosas contribuições.

O título dessa Noite, alinhado ao tema do X ENAPOL, foi inspirado por Teresa Pavone (EBP/AMP), Diretora de Biblioteca da Seção Sul “espécie de haikai de Lacan, ficou marcado para mim desde a primeira vez em que o li e nunca mais o esqueci. “O amor é um seixo rindo ao sol”. Lacan diz que a metáfora “recria o amor numa dimensão que pude dizer que me parece sustentável, contrariando seu deslizamento sempre iminente para a miragem de um altruísmo narcísico.” Ondina Machado, de partida, nos propôs pensar o título da noite de trabalho mais como uma “jaculatória” do que como um haikai, no sentido da interpretação analítica. Apesar de ambos os tipos de dizeres se caracterizarem por uma poética e pelo prazer da fonação, além de consistirem em uma espécie de um lançamento em jato de um dizer. Ondina propôs pensarmos o título como um dizer jaculatório, pela rima que o verso contém e por sua sonoridade. Lembrando que Lacan tinha um apreço especial por esse tipo de dizer. Trouxe-nos, assim, a ideia de como podemos tocar o real pelo sem sentido, mas que tem um ponto de amarração dos registros, na fonação. Tem a letra e tem a métrica, a melodia e o som. O som e o verso como dizer poético importantíssimo para a jaculatória e para a interpretação analítica. Um dizer que toca o real.

Os textos que seguem nos trazem Ecos do X ENAPOL. Encontro cujos efeitos e avanços epistêmicos colocaram um marco importante no tema sobre o amor e sua atualidade para a psicanálise lacaniana.

Diego Cervelin discorre sobre “As loucuras de amor” levando em conta as mutações do laço social e do novo nas parcerias. Recorre a um texto de Oscar Ventura para situar o amor em relação às suas vicissitudes discursivas, ligadas ao grande Outro, aos arranjos e aos desarranjos entre a falta e o desejo; e, mais ainda, ligado às implicações do amor no gozo – “gozo do Um – que, inscrito numa dimensão tão basilar da vida pulsional, é Outro inclusive ao significante, ressoando baixinho, mas com força suficiente para fazer ruído entre os ditos e, assim, produzir equívocos”.

Destaca-se, no texto, ainda questões de relevo: o que de novo no amor há em nosso tempo? E ainda, que saída poderíamos pensar quando o discurso capitalista foraclui o amor e quando os significantes mestres contemporâneos proliferam? Abre-se assim, no texto, uma saída singular orientada pelo Um do gozo.

No texto “Exílio, saber e amor: um laço, Licene Garcia parte da mudança no estatuto do amor a partir das fórmulas da sexuação: “Lacan propõe que o amor e as parcerias já não são com Outro como pessoa ou como verdade. Já não se tratará mais do encontro entre o sujeito e o Outro, mas dos arranjos e desarranjos do falasser com o seu Outro. Ou seja, como o falasser responderá frente à sua condição estrutural de solidão, enquanto traço de exílio da relação sexual.” E especifica que o encontro amoroso, a relação, é sempre mediada pelo sintoma, o parceiro sintoma.

Aborda “esse ponto de exílio” que deixa marcas, traços, e abre uma pergunta instigante que desenvolverá no texto: “qual seria o lugar para o amor quando pensado a partir de sua relação com o exílio?”

Gustavo Ramos, em “Circulações do amor nas escolhas sexuais binárias e não binárias”, apresenta este tema indo algo além do denominado por Miller de “Ano trans” já que coloca uma pergunta central: “falar de binário e não binário é falar especificamente da questão trans?” Situa que a linguagem não consegue recobrir todo o gozo e “esse além nós podemos chamar de gozo do Um, o gozo não organizado pela linguagem, mas que deixa uma marca.” Sempre haverá um resto pulsional que resiste à representação. Pergunta-se, ainda, como seria possível acessar esse gozo? Traz uma orientação localizada na “intersecção vazia, porém esse vazio como bem lemos no último livro de Marie-Hélène Brousse, é cheio de energia, está pulsando de energia criativa.[1]” Coloca um desafio para sua abordagem que seria “uma outra fixão do real. Sob esse prisma, é preciso um détour, um desvio…”, desvio que parece nos levar ao novo “no amor”.


[1] BROUSSE, Marie-Hélène. Modo de gozar en feminino. Trad. de Cinthya Estrada-Plançon. Olivos: Grama Ediciones; Paris: Navarin Editores, 2021. p. 20.
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