#04 - SETEMBRO 2024
Editorial – Boletim Corpografias #4
A duas semanas da 5ª Jornada de Psicanálise da EBP – Seção Sul, o boletim Corpografias #4 traz uma série de textos que foram produtos da última preparatória, em torno do eixo “O discurso faz do corpo um corpo”. As questões giraram entre enunciação, enunciado, dizer, dito e discurso, convocando a uma distinção dos tempos lógicos, que inclui lalíngua e a letra. Conceitos que certamente voltarão a circular nas apresentações de trabalhos e conversações nos dias 4 e 5 de outubro.
No argumento, Cinthia Busato abordou o corpo, o gozo e o ato do analista, com algumas orientações clínicas: a distinção entre sutura freudiana e emenda lacaniana; a possibilidade de a presença do analista desestruturar algo no fantasma do analisante; e a de apontar a hiância entre o discurso e o corpo para recolher o Outro corporal.
Lemos o esforço de circunscrever o que não é a enunciação (nem enunciado, nem ato performativo, por exemplo) no texto de Eneida Medeiros, fruto do cartel fulgurante composto com Juliana Rego Silva, Juan C. Galigniana, Rafael Marques Longo e o mais-Um Antônio Teixeira. Ela contrapõe enunciação e discurso, e indaga se aquela percorre o caminho inverso deste: “Seria a enunciação o retorno da palavra, quando esse enunciado consegue resgatar o vivo do trauma do choque da linguagem no corpo, fazendo ouvir uma outra voz no texto, diferente da que se expressou no enunciado?”. Com Joyce, também distingue mistério e enigma.
Outro autor convocado é Michael Foucault, a quem Juliana recorre para tratar então, não somente do choque de lalíngua, mas do acontecimento de corpo no encontro com restos discursivos dispostos na cultura. Como podemos pensar o que ressoa disso na clínica hoje? Sugere a interdisciplinaridade “como um dos caminhos possíveis para a psicanálise estar à altura de sua época”.
Isso nos conduz à discussão sobre as funções de lalíngua, da linguagem e da equivocidade da letra, levantadas por Juan C. Galigniana ao questionar o que se entende por “um corpo que funcione”, a partir do caso de duas irmãs indianas tardiamente submetidas à humanização. Enfatiza, ademais, a proposição lacaniana de que “o saber do um se revela não vir do corpo”, senão “do significante Um”.
Por outra via, com base na questão de Cinthia Busato sobre o que se inclui do vivo do corpo no ato analítico, Rafael Marques Longo faz uma provocação acerca da função do gozo do analista.
E quais as condições de possibilidade para o vivo do desejo da criança? A pergunta fundamenta a contribuição de Fernanda Baptista no texto Ensinar a dizer. Valendo-se de uma vinheta clínica, a da pequena cozinheira, ressalta a “cadência entre ausência e presença”, tanto na relação mãe-filha, quanto no par transferencial. Rafaela Maester, desde a comissão de referências, sustenta “o analista como presença viva que pode fazer ressoar através da vibração da voz, do olhar, da própria movimentação do corpo, a vivacidade necessária na escuta de cada caso”.
Por sua vez, Jesús Santiago apresenta formulações clínicas que indicam como se aprisionam os sujeitos obsessivos, considerando a estratégia de fazer-se de morto diante do desejo: trancar-se na “jaula de seu narcisismo” para dar conta das “feras do real”. Então, como arrancá-los da ascendência do olhar, servindo-se da equivocidade com o objeto a voz?
Acudindo ao último ensino, Teresa Pavone resgata o uso inovador da teoria dos conjuntos de Frege para “chegar à questão do Um e distingui-lo do ser, em Lacan, a partir […] do conjunto vazio que inicia a série dos números naturais”. Face a isso, como se dá o desenvolvimento lógico que funda o Um?
Presente em cada número do Corpografias, com sua obra, o artista visual Francisco Faria detalha a lógica do seu processo de criação em entrevista à psicanalista e ensaísta Bianca Dias. Diz-se interessado nas margens das paisagens, quase despercebidas, mas cuja beleza se impõe pelo tempo. Seu trabalho passa por encontrar “o visível ali onde seu significado estava de tal forma reconhecido, e triunfalmente calcificado, que quase havia deixado de existir”. Virá-lo do avesso.
A comissão de acolhimento, na voz de Maria Luiza Rovaris Cidade, traz a dimensão do enlaçar corpos e experiências, e convida-nos a uma jornada de celebração com poemas de Hilda Hilst, Matilde Campilho e Aline Bei, além de novas playlists.
As inscrições para a 5° Jornada da Ebp-Sul se encerram no dia 04 de outubro. No site, você encontra as sugestões de hospedagens em Florianópolis. Prepare-se!