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Editorial Boletim Corpografias #1

O lançamento da 5° Jornada da EBP-Seção Sul, acontecido no dia 08 de maio, causou efeitos. Orientações, questões e inquietações surgidas na conversação marcam o início do caminho rumo a outubro. Fazendo série com esses efeitos, eis a publicação de nosso primeiro número.

Entendemos o Boletim como uma superfície, um corpo – por que não? – que possa ser tocado e atravessado pelo trabalho de cada um de vocês. Nessa direção, e como tão precisamente pontuou Nohemí Brown em sua apresentação do argumento: “é com a linguagem que nós contamos, não saímos dela”. Uma vez advertidos disso, apostamos em fazer algo diferente, algo novo com ela. Esse saber-fazer caracteriza a potência do discurso analítico em seu lugar de exceção à lógica da dominação, e pode possibilitar a transmissão da psicanálise pela reinvenção dos uns-sozinhos – que Gresiela retoma com tanto cuidado em sua fala de abertura.

A escolha do nome do boletim procura traduzir algo dessa aposta. Partimos da dança como primeira alternativa: Coreografias. Não seria também ela uma busca de articular o movimento dos corpos em suas sincronias e assincronias? Uma tentativa de laço? Um breve passo para lá, permitiu-nos a introdução de um segundo elemento, a letra p em substituição da e: Corpografias.

A verdadeira descoberta se deu logo em seguida. No encontro com os reflexos criados entre os poemas de Josely Vianna Baptista e a arte visual de Francisco Faria, presentes no livro Corpografias, de 1992[1]. Agradecemos a ambos, muito especialmente, pela autorização ao uso de algumas dessas obras, que vocês terão oportunidade de apreciar a cada edição.

Se não é sem algo do impossível de dizer que a psicanálise se move, esses artistas nos relembram, com seus traços, as invenções possíveis. E mais: há um momento dessa experiência criativa em que se revela o que Francisco Faria chamou, em uma conversa amena, de uma dimensão do indescritível.

Coreografias e Corpografias. Ao colocar as duas letras em alternância contínua, surgem esses nomes em torção quase moebiana. Assim, eles escapam à fixação, abrem-se a deslocamentos imprevistos. Cada dançarino-sozinho ganha oportunidade de inscrever, com seu corpo, rodopios singulares. Quem sabe possibilitando a emergência daquilo do corpo que não é fisgado pelo discurso coreográfico.

Na terceira linha do poema visual que acompanha este editorial[2], não mais há as duas letras. Contudo, algo resta. Um grafema, essa unidade mínima distintiva da escrita? Uma função? Não qualquer uma, mas não é o momento de nos determos em suas implicações ao longo do ensino de Lacan. Mantenha-se, por enquanto, a imprecisão.

O que nos interessa é esse efeito um pouco enigmático e de fuga de sentido que surge. Aqui o significante grafias ganha potência, porque disso pode advir algo do singular da escrita ou do dizer. Um risco, um traço, um giro de um corpo vivo.

Sim, há o impossível e sua irredutibilidade no real. Mas há, também, a fortuna de uma aposta no que é possível. Não é isso que parece ecoar desta fala de Lacan?

Como de costume, tenho algo a lhes dizer. Mas hoje, porque tenho a oportunidade – é o dia de meu aniversário – gostaria de poder verificar se sei o que digo.

Apesar de tudo, dizer visa ser escutado (…) Sem dúvida, gostaria que alguém escrevesse alguma coisa que justificasse o trabalhão que venho tendo há pouco mais de vinte anos. O único modo de justificá-lo seria que alguém inventasse qualquer coisa que pudesse me servir. Estou convencido de que isso é possível.[3]

Vale a provocação. Estejamos convidados a trazer à baila os corpos e a-riscar um passo a mais, para um a um, não sem os outros, podermos reinventar e transmitir algo da psicanálise de orientação lacaniana.

 

Comissão do Boletim:

  • Juan Cruz Galigniana (Coord.)
  • Andrea Tochetto
  • Luciana Romagnolli
  • Paula Nocquet
  • Silvia Lazarini

Envio de textos pelo e-mail: jcgaligniana@gmail.com
[1] Baptista, J.V & Faria, F. Corpografias: Autópsia poética das passagens. São Paulo, Ed. Iluminuras, 1992.
[2] Criação que Luciana Romagnolli extraiu, no singular de seu estilo, de nossas conversas e trabalho coletivo na comissão do Boletim.
[3] Lacan, J. O seminário, livro 23, O sinthoma. (1975-1976). Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Zahar, Ed. 2007. p. 125. Lição de 13/04/1976.
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