Oscar Reymundo (EBP / AMP) O que seria a época na perspectiva analítica? No caso…
Editorial – Boletim PULSaR #02
Editorial – P U L S a R 2
Este segundo boletim traz, na abertura da seção “Ancoragens”, o primeiro eixo temático de nossa jornada, a saber, “O gozo e a época”, escrito por Oscar Reymundo, o qual inicia com uma questão orientadora, um farol por onde o tema se desdobra: “O que seria a época na perspectiva analítica?”. A partir da pergunta, articulam-se, entre outros, conceitos como modos de gozar, de viver a pulsão, segundo um conceito de discurso. Oscar acrescenta, retomando Lacan no seminário da Ética, que “no mundo de hoje prolifera um ruído, um mal-estar que, como psicanalistas, não temos motivos para não escutá-lo”. Escutar o ruído da época, uma questão ética e política da psicanálise, frente a qual Oscar se pergunta: como ofertar um bom uso de um analista, hoje?
Ainda nas “Ancoragens” deste número de P U L S a R, um segundo momento de elaboração é ofertado pela comissão epistêmica, que desdobra a temática do bom uso do analista, ampliando-a para questões que buscam localizar as ferramentas que um analista pode ter na sua prática para enfrentar o que há de mais atual em sua época, o gozo. Discurso, escuta, dizer, palavra, solidão, S1, ética, são significantes que a comissão destaca nas perguntas e que podem orientar os trabalhos para que, nós praticantes, possamos dar mostras do que faz um psicanalista na sua época.
Abrindo a seção “Osso” deste segundo número de P U L S a R, em “Da solução sintomática do isolamento à solidão do falasser”, Juan C Galigniana retoma os encadeamentos propostos por Oscar Reymundo a fim de destacar uma urgência que se manifesta na relação entre a clínica psicanalítica e a época. Ou seja, considerando – por exemplo – as diferenças entre solidão e isolamento, ela se manifesta em como possibilitar que algo do gozo também possa participar do laço e até mesmo do discurso muito embora um tanto do real sempre escape. Isso, na verdade, nos permite perguntar até que ponto um percurso analítico não implica justamente acolher algo do ruído mobilizado pelo sintoma para permitir que, a partir dele, possa surgir não tanto um sentido estável, mas alguma extração lógica em torno do modo de gozar de cada um, algo que consiga abrir espaço para um saber-fazer com isso.
Na continuação da seção “Osso”, em “A época e o espírito do tempo: amor, desejo e gozo”, Nancy Greca Carneiro traz questões sobre a época a partir de alguns momentos do ensino de Lacan, o que produz uma boa conversa sobre os tempos que correm e os efeitos do discurso capitalista nos tempos do sujeito e no seu modo de gozar. “O que oferecer a um sujeito exaurido, desconectado, seduzido pela imagem de si, capturado pela oferta constante de objetos descartáveis, que exige um gozo direto que prescinde do amor, contorna o desejo e a castração e o toma como objeto a ser escaneado, contabilizado e classificado?”. Seu texto nos deixa o convite a pensar o lugar do discurso analítico, como aquele que pode fazer surgir um outro estilo de significante mestre. Uma possível resposta à urgência da época?
Por fim, este número de P U L S aR ainda conta com a participação da comissão de referências, que parte dos clássicos freudianos, passando por Lacan e Miller, para nos lembrar que não é novidade que a existência da psicanálise depende do seu tempo. Algo disso já se apresenta, por exemplo, em Psicologia das massas e análise do eu, quando Freud faz a dobradiça entre a psicologia individual e a psicologia social. Uma dicotomia há muito caduca, mas que na orientação lacaniana, Miller retoma da seguinte forma: “Para poder situar nosso modo de gozo em relação ao Outro, é preciso estar separado dele. Ora, um traço do universo contemporâneo é que o Outro desaparece”. Se, para Freud, havia o interesse em tensionar o individual e o social, numa época em que o Outro desaparece, a dicotomia não se sustenta e o que aparece é o gozo do Um. Por isso mesmo, talvez haja um trabalho a mais para ser considerado quando se trata de manter vivo o discurso analítico, já que, embora aponte para o Um, ele ainda é um discurso, ou seja, algo que permite fazer laço. A comissão de referências nos deu pistas para avançarmos nesse trabalho!
Boa leitura!
Comissão editorial do boletim P U L S a R