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O corpo falante é político

Mariana Dias
Cartel Fulgurante – Eixo 2

[Foto de Virginia Benevenuto- Transobjeto – Festival de Curitiba, 2017]
A psicanálise é a parceira êxtima da ciência – visto que a noção de sujeito é impossível de ser excluída do exterior da ciência e seu método, por sua vez, revela-se como o interior próprio ao sujeito do inconsciente freudiano¹. Não se opõe à medicação como ferramenta auxiliar para que um sujeito possa aliviar a angústia e falar. Entende as religiões como máquinas de fazer sentido e um modo de tratar o gozo – vide a relação, por exemplo, da ética protestante com o espírito do capitalismo, tese de Max Weber. E até mesmo testemunha na atualidade como a via da superidentificação à norma pode funcionar como modo de limitar o transbordamento de gozo nas psicoses ordinárias – abrangemos algo nesta linha se pensamos na função que pode cumprir na sociedade um ideal da estirpe do American Way of Life.

Sim, podemos dizer que o psicanalista ocupa no social uma posição de extimidade. O que quer dizer um nem dentro e nem fora. Mas não se trataria de encontrar a função social do analista. Pois a política da psicanálise está para uma ética do caso a caso e não para A verdade. O psicanalista precisa estar à altura da subjetividade de sua época, mas sabendo que é impossível estar à altura do real. A psicanálise precisa saber bem-aí-fracassar; é uma condição para sua existência.

Como disse Bassols em Una política para erizos y otras herejías psicoanalíticas: “a política não é outra coisa que o próprio lugar da fratura da verdade”². Em psicanálise, conhecemos este lugar da fratura da verdade também por um outro nome: chama-se ato analítico. Miller dirá em Respuestas de lo real que a consistência do Outro está fundamentada numa estrutura que se recobre a si mesma. E que a condição para situar-se a nível de ato analítico é, precisamente, a inconsistência do Outro³. Ou seja, uma lógica na qual a fratura não se recobre, fica exposta. Logo, não seria o ato analítico um ato político?


Referências bibliográficas
¹ BASSOLS I PUIG, M. (2015). “A psicanálise, a ciência, o real”. Rio de Janeiro: Contra Capa, p. 13.
² BASSOLS, M. (2018). “Una política para erizos y otras herejías psicoanalíticas”. Olivos: Grama Ediciones, p. 56.
³ MILLER, J.-A. (2024). “Respuestas de lo real”. Buenos Aires: Paidós, p. 136.
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