#04 - SETEMBRO 2024
O corpo como limite
Mauro Agosti
Participante da Comissão de Referências Bibliográficas da 5°Jornada da EBP-Sul.
Do corpo afetado ao corpo como limite, qual torção aí?
Inicialmente me orientei pelo impacto dos discursos nos corpos, mas a posteriori, uma nova direção se me apresentou para acrescentá-la: os modos de habitar os discursos e sua relação com os limites. Esta possibilidade veio a partir de um encontro com um texto cujo título me causou “Ceder el goce o ceder al goce: discurso capitalista y acto analítico”[1] e do qual faço a seguinte extração:
“Se hace lazo cuando se cede goce: por respeto, por amor, por saber, por deseo… Concretamente, los discursos organizan modos de ceder el goce. Los distintos modos de resolver la imposibilidad configuran distintas maneras de aceptar los límites del lenguaje. El agente del discurso comanda el modo de ceder goce, modo por el que se permite que el discurso continúe. […] Pero en el discurso capitalista – y en el científico cuando se alía con él – no hay posibilidad de discurso porque no se pide ceder el goce sino ceder al goce. Se promete que no es preciso un menos de goce para resolver, que no hay que perder nada, al contrario, se promete una ganancia de goce. Se trata al goce con más goce. El mercado provee los objetos – y así pasan a ser objetos de consumo el saber, el amor y la política, por ejemplo –. El goce así entendido supone una satisfacción para todos igual, no se trata del goce singular como lo entiende el psicoanálisis. La experiencia de aceleración y excitación creciente de nuestro tiempo es fruto de esta imposibilidad de discurso: el circuito de satisfacción es contínuo y la tensión no se descarga más que por llegar al límite del cuerpo, incluyendo la posibilidad de morir”[2].
Esta referência permite avançar que estamos perante um “não-discurso, um anti-discurso” que nega a perda, como enuncia a autora. Sabemos que estando na linguagem, algo sempre se perde e, portanto, inevitavelmente aparecerá o resto, aquilo que não pode ser transformado retornando então no real. Desde os tratamentos do gozo que produz a ciência aliada ao capital, se exclui a dimensão do gozo singular e da transferência, sendo esta a que pode fazer de limite no marco de um discurso qualquer. Então, sem perda, sem laço, sem palavra, o corpo passaria ao primeiro plano como limite? Neste anti-discurso capitalista, ao rechaçar a cessão de gozo, se perde a possibilidade de responder tanto por parte do agente como pelo sujeito, se perde assim o sujeito?
O discurso analítico, via a transferência, visa a pensar em modos de que a perda seja reintroduzida e apaziguada. Ele se oferece para elevar à dignidade de um sintoma, aquilo que empurra o corpo e assume várias formas que perturbam o funcionamento deste. Será então interessante pensarmos que o ato sob transferência poderia ser uma das respostas da psicanálise ao limite da capacidade do simbólico, ao problema do gozo?