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Entrevista com Ary Farias sobre o Eixo temático 1 – Sexualidade em Freud

Fonte pixabay
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Gabriel Caixeta: Qual a importância dessa formulação de Lacan sobre a sexuação na clínica de orientação lacaniana?

Ary Farias: Agradeço a pergunta. Acho que essa é uma questão que responderia toda a nossa Jornada. Como ela é ampla então eu vou me ater talvez a uma resposta um pouco preambular, introdutória, visto que nós ainda teremos a participação de nossos colegas que desenvolveram os outros eixos temáticos. Eu desenvolvi o primeiro eixo que é a sexualidade em Freud. Te diria que essa perspectiva da sexuação para Lacan, para a clínica que nós enfrentamos hoje, ela é nuclear. Uma vez que partimos do eixo que desenvolvi, que foi Freud, nós iniciamos o raciocínio a partir de uma premissa, de uma lógica fálica, de uma questão edípica. Essa foi a sexualidade desenvolvida por Freud. Evidentemente que essa sexualidade desenvolvida por Freud já não dá mais conta de ler o que se efetiva hoje nos corpos, o que se efetiva nos laços, a forma como as pessoas amam, a forma como as pessoas estabelecem os seus prazeres e por fim como cada corpo goza. Evidentemente que isso não é uma dispensa aos princípios freudianos uma vez que isso deveria ter como indispensável, nós nunca iremos dispensar os princípios. Ainda que o que nós observamos, o que estou propondo, seja a verificação clara do desenvolvimento, do avanço que se teve a partir dessas premissas. Não a dispensa! Não desenvolvemos sem romper com os princípios de Freud quando lançou essa questão da sexualidade que, historicamente nós sabemos que Freud escandaliza o mundo com essa questão da sexualidade infantil, ou seja, quando ele rompe com esse conceito de ingenuidade infantil e vai dizer que há não só uma sexualidade vigente e sim toda proliferada nesse corpo. Nós percebemos que isso não é pouca coisa. […]

Gabriel Caixeta: Você poderia falar um pouco sobre a diferença entre sexualidade e sexuação na psicanálise?

Ary Farias: Eu me proponho a pensar, volto a dizer, de uma maneira muito introdutória que nós pudéssemos pensar a sexualidade como particularidades agrupadas, ou seja, a sexualidade como sendo os destinos das composições do corpo, talvez um pouco ligada ainda a essa questão do gênero e do sexo. Ou seja, ainda muito freudiana essa questão da sexualidade. A questão da sexuação já seria então essa verificação que nós observamos na nossa clínica de que esses destinos prévios já não dão conta de receber os anseios de prazer e de gozo desses corpos do contemporâneo, uma vez que, se pensarmos que um corpo, ele repercute essa infecção da linguagem, de como cada sujeito vai responder a essa infecção, como vai responder a essa febre, a essa composição de desmesura que a linguagem causa na carne. Ou seja, por isso, nós temos um corpo, um corpo desmesurado pela linguagem. Não só desmesurado de uma maneira nefasta mas uma desmesura talvez até um pouco lírica, tem um pouco de trágico e de lírico nessa repercussão dessas afecções do corpo pela linguagem. Essa repercussão de linguagem que nós conhecemos pelo codinome de falasser, ou seja, como cada sujeito responde a isso que é trágico e ao mesmo tempo mágico, que repercute a cultura, que repercute um momento sócio-histórico que vivemos. Temos que lembrar que os corpos são sempre contemporâneos. Ainda que os corpos tenham algumas ações nostálgicas, eles sempre respondem no contemporâneo, ainda que seja para negá-lo. A proposta que faço é pensarmos dessa forma.

Gabriel Caixeta: Como o eixo temático em questão toca no mistério da sexuação, tema das nossas jornadas?

Ary Farias: Esse é um mistério que é paradoxal: ao mesmo tempo que ele se mantém como insolúvel no aspecto do mistério, ele também tem um aspecto de evidenciação inegável que são as repercussões no corpo, como nós vivemos as repercussões do impulso em nosso corpo, como essa questão se mostra insolúvel, inevitável para todos nós. Ou seja, como é impossível tirar a referência nuclear do sexo para o falasser. A importância reside nisso que me parece ser estrutural: a sexualidade como nuclear e a partir disso, desse núcleo sexual, todas as repercussões de laço e de como o sujeito vai se servir de seu corpo na relação com o Outro, nas composições amorosas, como ele vai tecer seu destino sempre nessa condição de desamparo. E esse não precisa necessariamente produzir uma fobia pela vida, pelo contrário, talvez esse desamparo possa ser justamente o motor da invenção que nos é possível enquanto seres falantes.

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