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EIXOS TEMÁTICOS

Nossa convidada especial nestas V Jornadas, Marina Recalde, respondendo a uma pequena provocação da equipe editorial do MNEMIS, nos brinda com um fragmento preliminar do que lhe ocorre a partir do tema proposto: Corpo, M-E-M-Ó-R-I-A. O resultado vocês poderão acompanhar abaixo. Em poucas linhas, Marina, acende a promessa do que podemos esperar da sua participação e incendeia o desejo de que setembro chegue logo. Confira!

 

Marina Recalde (EOL/AMP)

Agradeço o convite para participar deste boletim sobre um tema tão apaixonante para mim como o do Corpo e da Memória. O tema me pareceu uma excelente escolha, primeiramente colocando o corpo e, em seguida a m-e-m-ó-r-i-a.

Em primeiro lugar, colocar o corpo em primeira instância já implica uma posição: para poder falar de memória, é preciso ter um corpo. Não há memória sem corpo.

E, por sua vez, colocar os hifens entre as letras, me fez pensar que talvez tenha sido a forma que encontraram, os que pensaram o título, para evidenciarmos que a memória não pode ser pensada como um todo, somente em seus traços, impactos, fragmentos. Nossa memória é isso: fragmentos de gozo que impactaram nosso corpo. A memória nunca é total.

Nietzsche, em algum momento, propôs imaginar “O caso extremo de um homem que perdeu a força de esquecer, alguém que foi condenado a ver, em toda parte, um vir-a-ser. Esse homem não seria mais capaz de acreditar em sua própria existência; vendo todas as coisas fluírem separadamente em pontos móveis, ele se perderia, assim, nessa corrente de vir-a-ser.”[1]

Alguns dizem que Borges não podia desconhecer este fragmento (era um grande leitor de Nietzsche) quando escreveu, em uma noite insone, o Funes, o memorioso. Não sabemos se sim, o certo é que, tanto para um quanto para outro, a impossibilidade de esquecer é uma condenação. E Nietzsche acrescenta algo mais: Esse homem não seria mais capaz de acreditar em sua própria existência. Para crermos em nossa própria existência é preciso que nossa própria memória seja fragmentada. Talvez os hifens nos lembrem que o esquecimento é necessário.

Como bem colocam no argumento, é Freud quem situa entre a percepção e a consciência, os traços sucessivos de memória, constituindo o inconsciente. Corpo e memória se entrelaçam por estes traços. E este é o corpo ao qual Lacan vai se referir quando coloca que os traços significantes afetam o corpo, mas, fundamentalmente, o constituem.

Temos umas Jornadas pela frente.

Conversaremos sobre isto e sobre os casos atuais em que é difícil a organização de um corpo. O que também torna muito difícil a intervenção do analista lá, onde algo desta organização e da inscrição falhou em seu ponto fundamental e os sintomas, enquanto formações do inconsciente, escasseiam.

Tradução por Bartyra Ribeiro (EBP/AMP).
Coordenadora da Comissão de Tradução das V Jornadas da EBP-SLO.

[1] Nietzsche, F. Sobre a Utilidade e a Desvantagem da História para a Vida, inconsiderações Extemporâneas, Tradução de André Luís Mota Itaparica. São Paulo: Hedra, 2017.
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