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O tema do amor é realmente inesgotável e sem dúvida a maior inspiração em todas as suas faces para os escritores, artistas, compositores. Também persegue os intelectuais e até mesmo os cientistas. Segundo Lacan, os próprios analistas só falam de amor. Então, embora redundantes, convidamos a todos para que escrevam e proponham seus textos. Para orientá-los quanto ao recorte, nossa comissão científica propõe três eixos temáticos:


Eixo I:

O amor e o acontecimento: pandemia, política, segregação, novos laços e gênero

Por Luis Francisco Camargo

Para além do inconsciente intérprete, encontramos os acontecimentos no terreno do Um, do inconsciente real. As suas inscrições não dependem somente da força do impacto da contingência, mas principalmente de um trabalho de inclusão num discurso. Atualmente, somos convocados pelo Outro social a nos manifestarmos sobre a pandemia, a política, a segregação, os estudos culturais e as teorias de gênero. Somos convidados a falar, escrever e inscrever na experiência da psicanálise os acontecimentos, a incluir o novo. Por um lado, provocados a constituir novos laços de discurso. Por outro, a reposicionar a dimensão radical da experiência da psicanálise na contemporaneidade. O amor tem um papel fundamental, pois promove a condescendência do gozo ao desejo e a inclusão do outro na sua radical singularidade. O amor é um acontecimento. Sua realização implica na cessão de gozo e nos seus rearranjos. A pandemia, a política, os novos destinos das pulsões e seus modos de satisfação, que podem constituir comunidades e micrototalidades, bem como as novas soluções sintomáticas e as diferentes modalidades de laços, colocam constantemente em xeque as tentativas de adaptações do Ser ao Outro, demonstrando o fracasso das taxionomias sobre o inclassificável do gozo e, consequentemente, a evidência da inexistência do Outro. Estamos no tempo das tensões entre o Um e o múltiplo, diante da queda do patriarcado e do avanço da pluralização dos Nomes-do-Pai. Experimentamos no social o regime do gozo que não cessa de não se inscrever, o regime do gozo como tal. Convidamos a todos a escrever para as nossas Jornadas sobre o impacto destes novos acontecimentos na experiência da psicanálise; com amor.


Eixo II:

O amor na experiência psicanalítica

Por Cristiano Pimenta e Denizyê Zacharias

“Eu não sabia explicar

nós dois,

ela mais eu

porque eu e ela…”

Os versos acima pertencem à canção de Chico Buarque chamada “Porque era ela, porque era eu”. Eles apontam para aquilo que Miller formula em El partenaire-síntoma, a saber, “o estatuto eminente do amor (no último ensino de Lacan) é suprir a relação sexual que não existe” (Miller, 2008, p. 158). E é nisso que “vemos surgir o amor em uma função inédita… a de estabelecer a conexão com o Outro… é um amor que está pensado ao nível do real” (Miller, 2008, p. 157). Podemos investigar o amor ao nível do Imaginário e do Simbólico, mas há também o amor ao nível do real, onde subsiste o que não sabemos explicar pelo simples fato de que aí as palavras não são suficientes.

“… íamos tontos os dois

assim ao léu,

ríamos chorávamos sem razão…”

É um fato que quando alguém se lança na experiência analítica “transformações se produzem; aquilo que aparece ao sujeito como revelações vai se sucedendo. E, em sua vida há ecos de que as coisas mudam.” (Miller, 2011, p. 142). Pois bem, gostaríamos de indagar a respeito das mudanças no modo de amar do sujeito contemporâneo, tanto no interior do tratamento – nas relações do analisando com o analista, na transferência positiva ou negativa, assim como na contratransferência – quanto nas relações amorosas na vida do sujeito.

Assim, a questão do amor, os seus dramas, suas armadilhas, as defesas de que cada sujeito se vale, devem ser investigadas. Os amores loucos e os amores dos loucos, dos Trans, dos homos e dos heteros, igualmente. Às vezes, o tratamento do neurótico vai no sentido de um consentir com o amor, não sem que esse delicado percurso seja árduo, doloroso, recheado de ódio e cólera.De todo modo, é inevitável percorrê-lo para que se abra a possibilidade de que um amor mais digno se dê.

“… sei que o que tinha de ser

se deu;

Porque era ela,

Porque era eu.”

Não poderíamos deixar de investigar também o amor na época em que a função paterna está fraturada, quando prevalece a dimensão dos “Uns sozinhos”. É aí que o sujeito se vale dos aplicativos para que o encontro se dê, sobretudo em tempos de pandemia. Esta obrigou o tratamento analítico a recorrer à tela do celular ou do computador para que a palavra pudesse circular e não ser estancada. A investigação do amor na experiência analítica é, portanto, ampla e convidativa.

Referências:
Lacan, J.; O seminário, livro 20, mais ainda. Rio de Janeiro; Zahar, 1985.
Miller, J.-A.; El partenaire síntoma; Buenos Aires; Paidós, 2008.
Miller, J.-A.; Perspectiva dos escritos e Outros escritos de Lacan; Rio de Janeiro; Zahar, 2011.

Eixo III

O amor nos campos da religião, da sociedade, da ciência, das artes, da mitologia, da filosofia e mais ainda…

Por Claudia Murta

Ao iniciar seu Seminário “A transferência”, Lacan anuncia que “no começo era o amor”, base da experiência analítica, base de sua teoria. Em se tratando de psicanálise, o amor, no ponto máximo de sua elaboração teórica, é, antes de tudo, uma prática e, para falar de amor, decide comentar o “Banquete” de Platão que, dos textos sobre o amor, é o mais comentado de todos os tempos. Contudo, Lacan faz uma abordagem muito original do texto platônico, tomando-o por “relatórios de sessões analíticas” e sua leitura segue o caminho de uma psicanálise. Acompanhando o comentário lacaniano, ao passarmos pelos primeiros discursos apresentados no texto platônico, deparamo-nos com o amor percebido a partir do campo da religião, da sociedade, da ciência, e das artes trágicas, cômicas e pastelão; campos esses que, além da mitologia e da própria filosofia, são fecundos para as flechas certeiras de Eros.

O primeiro discurso se desenvolve pelo ângulo da religião e Lacan adverte que, para Fedro, falar de amor é falar de teologia. Diante do segundo discurso, proferido, dessa vez, por Pausânias, Lacan aponta uma apresentação social das relações de amor. O discurso seguinte é exposto por Erixímaco do ponto de vista médico e científico. Em relação aos discursos de Aristófanes, comediógrafo, e Agatão, tragediógrafo, Lacan comenta que há entre eles um jogo: onde se poderia esperar a comédia sobre o amor, encontra-se a tragédia; onde se poderia esperar a tragédia sobre o amor, depara-se com o fiasco. Já, quando se espera que a filosofia venha a dizer a verdade sobre o amor, Platão apresenta o mito e, por fim, diante de Alcibídes, Sócrates aparece, segundo a avaliação de Lacan, como o primeiro analista da história.

Assim, os campos da religião, da sociedade, da ciência, das artes, da mitologia, da filosofia, admitem, junto à psicanálise, portas de entrada para a aproximação do tema do amor, mas…  Atenção e muito cuidado na passagem pelo labirinto do amor, um novelo de lã em mão pode ser indicado.

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