Aberturas e fechamentos na Escola

Fala de encerramento na comissão da Diretoria de Cartéis 2021-2023
Renata Martinez

Boa-noite a todos! Que bom estar ao vivo aqui na nossa casa nesse brinde de encerramento de mais um ano da vida da EBP Rio. Gostaria de começar agradecendo às minhas colegas de comissão Maricia Ciscato, Ana Luiza Rajo, Cristina Duba, Maria Antunes e Sandra Landim pelo trabalho potente que fizemos juntas ao longo desses quase dois anos. Muitas vezes esses agradecimentos são meras formalidades, mas espero que em minha enunciação isso possa ir além… Quero agradecer também à Ruth Cohen pela generosidade e abertura ao novo com que conduziu essa gestão e a Cristina Frederico, Ana Beatriz Freire e Maricia Ciscato, cada uma a seu modo, pela quase conclusão do desafio a que se propuseram nessa diretoria!

Quando a Maricia me convidou para compor a comissão de cartéis, eu estava finalizando minha passagem pela diretoria de secretaria e tesouraria, feliz, porém exausta. Ponderei, mas resolvi aceitar, apostando e desejando que o exercício da permutação me oferecesse boas surpresas. Obrigada, Ma, pela oportunidade e pela parceria, aprendi muito com você, (aliás aprendo sempre, desde nosso encontro no ICP há 20 anos)!

Bem, para hoje, como a Maricia anunciou, combinamos de falar mais descontraidamente sobre algum ponto que tenha nos fisgado nesse tempo. Foram muitos eventos exitosos: noite de cartéis com Romildo, uma Jornada de Cartéis com mais de 40 trabalhos apresentados, a presença poderosa e inédita da lógica coletiva do cartel nas Jornadas da Seção e do ICP…

Porém, resolvi partir de trás para frente e falar de algo que apareceu no último “Procura-se cartéis”, em 18 de novembro último e que me surpreendeu por trazer um certo avesso às conquistas que acabo de mencionar: me chamou a atenção não apenas a baixa adesão de participantes nesse encontro como o que pude nomear de “angústia diante da entrada”. As falas giraram em torno desse afeto como algo marcante e muitas vezes impeditivo para se ir adiante. Relatos angustiados sobre as mais variadas dificuldades apareceram indiferentemente dos momentos da formação de cada um: na lida com a teoria, na formação de um cartel, na busca pelo Mais-Um e, principalmente, o que ficou claro para mim, a angústia diante da impossibilidade de vislumbrar um caminho a trilhar junto a Escola.

Como nos lembrou Miquel Bassols[1], recentemente, um pouco de angústia é necessário para a mobilização dos corpos, mas angústia em excesso, pode paralisar. Me perguntei se não corríamos esse risco ali e como fazer para subverter esse ritmo: como se dá o laço com a Escola? Por que vias? Sabemos, por experiência própria, que cada entrada é única, cada processo tem um tempo e um trajeto específico e, mais importante, está sempre em permanente construção. Afinal, a formação do analista é permanente. Segui pensando e me perguntei: seria a Escola responsável por favorecer essa via de entrada? Como a diretoria de cartéis faz parte disso? Afinal, éramos nós ali promovendo aquele encontro com o objetivo de ajudar os interessados a formar cartéis…  Sob aquele ponto de vista, paradoxalmente, a Escola me pareceu consistente como uma rocha, mas também etérea e intangível. E não porosa ou múltipla, capaz de servir, como nos propôs Lacan em seu Ato de Fundação, de refúgio ou base de operações contra o mal-estar da civilização.

Claro que aqui, com esse exemplo, estou extrapolando. Não podemos descartar as múltiplas portas oferecidas pelo amálgama Instituo e Escola, inclusive essa foi minha fala naquele dia como resposta à angústia presente. Entretanto, me lembrei de uma passagem de “Escola, voz e corpo”[2], texto preciso de Marcus André Vieira, quando diz que “a Escola como conceito, não pode ser pensada fora das situações concretas de sua existência ao preço de se tornar uma ideia congelada no céu das ideias lacanianas”.

Ou seja, precisamos dos acontecimentos e dos fatos. Assim, questionar esse fragmento da vida da Escola, tomar essa pequena parte pelo todo, poderia induzir ao reducionismo, mas preferi tomá-la como uma interrogação ou mesmo uma interpretação sobre o movimento e função não só das instâncias, mas de cada um de nós nesse exercício de construção. O que para mim se resume com a pergunta: como a Escola pode estar aberta e acolher como coletivo a necessária e solitária lida com algo do real que atravessa cada um no mal-estar do sintoma? Com esse impulso, sigo desejante e aberta para os trabalhos em 2023. Obrigada


[1] Bassols, M. “A psicanálise durante a pandemia”. In: Arquivos da Biblioteca 17. Publicação da Escola Brasileira de Psicanálise Seção Rio de Janeiro, agosto de 2022, pgs 105 a 119.
[2] Vieira, Marcus André. “Escola, voz e corpo”. In: Brochura da Conversação da EBP Aggiornamento democrátivo: O Um que enlaça e o Um que segrega. Coordenação: Angelina Harari. Conselho da EBP, março 2018, pgs 38 a 40.
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