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O CORPO FALANTE

X Congresso da AMP,

Rio de Janeiro 2016

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prática analítica que nos ocupa a todos, coletivamente; porém, a elucidar, mais

secretamente, mais discretamente, o que, como sujeito, me motiva a desejar, a

amar e a falar.”

p. 38

“… Lacan, por sua vez, ao fazer em seu curso um lapso de escrita, disse: “É

um erro grosseiro.” Com efeito, para transformar um erro em lapso, é preciso

implicar uma intenção inconsciente. O mesmo ocorre com o que chamei – eu

chamei? -, o que foi dito, uma vez, por Lacan, num contexto pouco claro:

o

inconsciente real

. Pois bem, é nesse nível que consideramos ter feito um erro

grosseiro. Somente se transformarmos esse erro, implicando nele uma intenção

inconsciente, ele se tornará um lapso.”

p. 54

“Nada os impede de tomar o inconsciente real no discurso do mestre. Se vocês

o capturarem no discurso do mestre, obterão um certo número de efeitos

terapêuticos, pois é isso que busca o mestre, a terapia universal.”

p. 54

“… Os discursos são modos de tratamento. O discurso da histérica também:

é um tratamento do inconsciente real que tende, preferencialmente, a tornar

doente, mas também é um tratamento que se aplica ocasionalmente.”

p.54

“O que pude desenvolver – evocarei na próxima vez – é congruente com a

verdade fundamental da psicanálise. A harmonia nunca é alcançada pelo ser

falante, a doença lhe é intrínseca e essa doença se chama foraclusão, a foraclusão

da mulher. Ela comporta não haver relação sexual. E está aí a mola da mínima

formação do inconsciente.”

p. 58

“Essas formações continuarão a florescer enquanto formos seres falantes.

O analista, seja um analista nomeado, analista autoinstituído, analista

experimentado, ou analista iniciante, o analista não está, em nenhum caso,

exonerado de tentar, como Freud nos deu o exemplo, esclarecer sua relação com

o inconsciente. Não disse amá-lo.”

p. 58-59

“… O que Lacan chama de sujeito suposto saber é um certo efeito de

significação que obtura a solução do desejo do analista. É, para simplificar, a

suposição do inconsciente, a noção, a nuvem espessa segundo a qual o que se diz

na análise quer dizer outra coisa.”

p. 115

“Uma vez que prestamos atenção à verdade – como deve ser entendido -, saímos

dela, deslizamos para a mentira. Lacan formulou isso nos seguintes termos: “Não

há verdade que, ao passar pela atenção não minta.” * Como indiquei da última

vez, trata-se de pôr em questão o sentido da própria operação psicanalítica, já

que ela consiste precisamente em prestar atenção às emergências de verdade, as

que emergem nas chamadas formações do inconsciente.”

p. 119

“Lacan manteve-se na linha da descoberta de Freud quando dizia, no começo

de seu ensino: Este discurso é o próprio inconsciente. É o que ele chamava de

discurso do Outro,*ou seja, ele concebia o inconsciente como um discurso, e

quando ele os deitou por terra, continuou a definir o inconsciente como um

saber, uma articulação. Essa última irrupção no ensino de Lacan foi feita para

negar isso. Pelo menos para abalá-lo, para nos ajudar a situar de modo diferente

o que acontece na experiência analítica.”

p. 119

“Quando Lacan diz que o inconsciente é real, ele acrescenta: “caso se acredite

em mim”.* Se acreditássemos no Lacan de 1953, diríamos que o inconsciente

é simbólico. No final de seu ensino, a definição de inconsciente passa por uma

virada:

o inconsciente é real,

quer dizer

, o inconsciente não é simbólico,

ou ainda,

quando ele se torna simbólico, torna-se outro. Por isso, podemos dizer que a

operação analítica faz o inconsciente passar do real para o simbólico, da verdade

para a mentira.”

p. 120

“… O que Lacan nos indica, aqui, é enorme, pois ele próprio enfatizara

que Freud descobrira a psicanálise prestando atenção nas histéricas, tema

abundantemente abordado por ele e também retomado. O que ele aqui nos

indica é que a autoanálise de Freud foi a primeira – e dizer autoanálise é dizer

muito -, ou seja, primeiro foi o fato do inconsciente real e, nesse sentido, a

associação livre é segunda. Ela é o romance da verdade. Por isso, também Lacan

disse que Freud não sabia o que fazia ao inventar o instrumento da associação

livre, ou seja, ele recorria ao sentido para resolver a opacidade do que emerge nas

formações do inconsciente.”

p. 121

“… Em termos definitivos, se fizermos surgir a fórmula segundo a qual o real

é bem mais contingente que impossível, então, com efeito, nos damos conta

da relação entre o real e o inconsciente – a fórmula, me apresso em dizer,

não é de Lacan, é de minha lavra, estou experimentando-a. Fala do modo de

surpresa através do qual o inconsciente se manifesta. Não se sabe quando o lapso

interferirá. Não se sabe quando o sonho nos trará um efeito de emoção que

traduziremos em termos de verdade. Não sabemos quando faremos o ato em que

tropeçaremos e cujo motivo explicaremos em nosso relato dizendo: é por isso,

implicando, assim, uma intenção.”

p. 127

“Do ponto em que estamos, não podemos não ver esse ponto de partida em

que a psicanálise é pensada pautada na ficção: uma ficção de psicanálise, já que

ela põe em cena um inconsciente sem real, um inconsciente todo simbólico,

puro correlato da interpretação, à medida que ela é bem-sucedida. Eu mesmo

desenvolvi essa questão, há anos: era lógico ir do conhecido ao desconhecido,

o inconsciente era o desconhecido, conhecia-se a interpretação e o fato de ela

Jacques-Alain Miller