EBP Debates #002

 

Iordan Gurgel

 

Iordan GurgelUma questão que nos parece relevante é se o congresso nacional pode decidir sobre o modo de gozo dos cidadãos. Observamos que os partidos políticos, constituídos a partir de princípios religiosos, insistem em generalizar seus axiomas, infringindo, inclusive, as normas que regem o processo democrático (é uma política do “para todos iguais” destacada por Jorge Pimenta). O fato de o Congresso formar comissões para instrumentalizar  e organizar determinado tema proposto por certo número de deputados, não o autoriza a decidir sobre temas que já têm reconhecido consenso nos fóruns técnico-especializados.

 

O fato recente de aprovação, na Comissão de Direitos Humanos, da chamada “cura gay” vem na contramão da história. Não somente por desconhecer a decisão do Conselho Federal de Psicologia (resolução do nº 1/1999) e da Classificação Internacional das Doenças - O. M.S. (que desde a sua revisão 9, de 1975, deixou de considerar a homossexualidade como  transtorno mental), interferir sem qualquer referência científica, considerando tão somente a moral e a religião, na autonomia dos profissionais e afrontar os direitos civis dos homossexuais, mas também por ignorar outras decisões de instituições moralistas, que não levam em consideração a singularidade do sujeito, o desejo, a pulsão e suas vicissitudes.

 

No dia 20 de junho passado, o grupo cristão norte americano Exodus Internacional, que tinha por objetivo a cura da homossexualidade, encerrou suas atividades, depois de 40 anos, com um pedido de desculpas do seu Conselho de Administração à comunidade gay, “por anos de julgamento indevido”. A proposta, agora, deste grupo é ser “... mais acolhedor com pessoas de todas as orientações sexuais”, consigna esta que vai contra os preconceitos e a intolerância, respeita a pluralidade democrática e concerne ao que a  psicanálise nos ensina que não se pode legislar sobre o modo de gozo singular a cada um.

 

Para a psicanálise, a sexualidade não se resume a uma necessidade fisiológica e suas diversas modalidades de manifestação não se constituem em patologias redutíveis a quaisquer formas de tratamento. Trata-se de uma concepção que vai contra o tratamento populista da moral privada, que, ao propor uma correção de comportamentos, ignora o desejo e a pulsão (como destacou o nosso colega Romildo).