Antônio TeixeiraAntônio Teixeira

 

NADA A SE COMEMORAR:

O National Institut of Mental Health (NIHM) finalmente abandona o DSM.

 

Como se dá com a carta da rainha do conto de Poe sobre a mesa do rei, o demasiado óbvio frequentemente está longe de ser evidente. Foi necessário chegar ao termo de cinco ciclos de pseudo-renovações para que o NIHM finalmente percebesse o que há muito se mostrava visível: a absoluta inanidade clínica do programa classificatório lançado pela American Psychiatry Association com o acrônimo de DSM. Na demissão de todo esforço de teorização do padecimento psíquico, o DSM por mais de vinte anos reduziu a construção do saber à indigência epistemológica das listagens, destinadas, como se sabe, a compor os inventários constantemente requisitados por pesquisadores reduzidos a técnicos de perícia no leito de Procusto da gestão.

 

Mas quem nos dera o abandono do DSM fosse o prenúncio de um novo esforço para se pensar o mental, fora dos enquadres disciplinares habitualmente sustentados pela doxa travestida de ciência. Nonada! No lugar das antigas classificações estatísticas, o velho naturalismo do antes-de-ontem mais uma vez se reanuncia como novidade pomposa do depois-de-amanhã. O mental é o cerebral, o genético, o físico-químico, quem sabe até mesmo o atômico ou o molecular. É a natureza do psiquismo pensada na forma mecânica do sistema, dócil ao devaneio burguês de que através da racionalidade técnico-científica poderemos enfim ter controle de tudo. Quanto ao sentido do sofrimento para o sujeito, à questão ética do desejo e às soluções singulares do gozo, passemos! Deixemos essas ficções aos psicanalistas em seus divãs obsoletos. Que se abram finalmente alas para o progresso da neurociência na passarela cintilante do Research Domain Criteria (RDoc) que o DSM não soube merecer!