Aos Cartéis da EBP, EFP-SLP, ELP, EOL e ao Colégio do passe da ECF
Caros colegas,
Dirijo-me a vocês no âmbito da preparação do Encontro Marcado com o Passe, que ocorrerá em 19 de março de 2022, por ocasião da Grande Conversação Internacional da AMP. Como sabem, trata-se do Encontro dos dispositivos das Escolas da AMP em torno de questões candentes do passe.
O que é candente hoje? Sabemos que é uma ilusão pensar que a psicanálise caminharia “nos trilhos”, só há avanço através de franqueamentos do sintoma.
Então – tenhamos coragem ao responder –, deixando de lado permutações e regulamentos, onde encontrar o sintoma (ou sintomas) do passe que permitiriam avançar?
A partir dessa orientação, todos os anos desde 2018, ao solicitar os relatórios do passe para o Conselho da AMP, introduzi ao final uma pergunta sobre sua percepção de sintomas, ou disfuncionamentos, ou novos usos do passe etc., em suas respectivas Escolas, em geral obtendo a cada vez um tranquilizador panorama de funcionamento calmo.
Parece que a máquina tem funcionado satisfatoriamente. Porém, justamente, se o passe funciona como uma máquina bem azeitada, é que tem algum problema.
A partir da Secretaria do passe dispõe-se de um amplo panorama na AMP que permite captar, às vezes, alguns movimentos de fundo. Assim, registrei o significante “nossos AE”, surgido na NEL, que celebrava dessa maneira a nomeação de uma colega da Escola. A expressão me surpreendeu e ainda mais quando comecei a escutá-la em outros lugares. Isso me colocou a trabalho[1], pois me pareceu o retorno de uma tendência que poderia distanciar o passe da Escola Una. De fato, desde então, o “nossos AE”, de uma ou outra forma, não deixou de se expandir.
Produzir uma interpretação que faça ondas não depende somente da vontade de fazê-lo, mas de uma química especial que poderíamos chamar “libido de Escola”, no sentido de escola da Orientação Lacaniana. Durante certo tempo, mesmo que localizado, o fenômeno não havia mostrado seu alcance mais profundo. Até encontrar-me com Jacques-Alain Miller, no mês de setembro passado, para organizar o Encontro Marcado com o Passe, que as coisas se ordenaram de outra maneira.
Conversando com Miller, a aresta do “nossos AE” revelou-se mais claramente, pois situava-se no mesmo sentido da expressão “passe regional” recolhida em um dos cartéis do passe. Destacava-se uma tendência à regionalização ou nacionalização do passe.
Se a “apropriação”, por assim dizer, do passe por parte das comunidades locais se solidificasse, significaria que a Escola Una não estaria no coração do passe e, entre outras coisas, a função do êxtimo perderia seu valor e seu sentido.
A pergunta é potente: haveria passe sem Escola Una? Neste ponto chegou o momento de se perguntar por que nunca, nenhum êxtimo, interrompeu a nomeação de um AE. Nenhum – há que dizê-lo – salvo a única exceção. A exceção então confirma a regra que surpreende ao constatar: a função do êxtimo é burocrática? O êxtimo é um expedidor de passaportes para a AMP? Os cartéis, apesar de reconhecerem o elemento de aposta de uma nomeação, pensam ser infalíveis? Estão dispostos a rever sua avaliação de um passe? Em todo caso, não deixa de ter um ponto inquietante, é algo que muito raramente ocorre.
A tendência à “regionalização” do passe não é o único elemento que devemos colocar em conversação e em debate se convier, há outras perguntas.
Recordemos que, em 2013, havendo-se nomeado oito AE durante o ano na AMP, falou-se em “chuva de AEs”. O que dizer quando, ainda sem haver terminado 2021, em um contexto de pandemia, já se havia nomeado 13? Exemplo notável é o da ECF que nomeou sete AE em 2021 enquanto havia nomeado dois em 2013. As cifras, sinal de um real, não dizem algo? Recentemente a ECF tomou a seu cargo a leitura desses e outros sinais para convocar um Colégio do passe e colocá-los a trabalho.
Continuemos avançando. Não chama a atenção que os AE, desde há muito tempo, raramente falem da passagem de analisante a analista? Algo pouco comentado e sem dúvida crucial. Por outro lado, como assinalou Miller recentemente[2], os AE centram os testemunhos na experiência de suas análises e não tomam a seu cargo a interpretação da Escola. Do que tudo isso fala?
Entrando concretamente nas funções dos dispositivos do passe: nos relatórios das reuniões do Conselho da AMP, divulgadas regularmente, destaca-se há tempos a escassez de produções dos cartéis do passe. Quando foram suspensas a produção e o ensino dos cartéis? Aqui deve-se apontar outra exceção, a EBP, que apresenta e debate bienalmente na AG o relatório teórico e clínico do passe, revisa o regulamento e efetua a composição do cartel. Porém, salvo esta exceção, a diminuição do ensino do passe parece uma tendência instalada que vem de longe, e as colegas que me antecederam, como Anne Lysy[3], já apontavam em seus relatórios. De minha parte, tive ocasião também de perceber essa tendência, como fiz constar em meu relatório do ano passado: “parece que a comunidade analítica prefere receber o ensino do passe dos AE que dos cartéis, como se uma equivalência entre ensino do passe e ensino dos AE houvesse se estabelecido”[4].
É por tudo isso que, para organizar em torno de alguns eixos o próximo Encontro Marcado com o Passe, havíamos pensado com Angelina Harari em começar um “Relançamento” da produção dos cartéis. Porém, visto o panorama revelado nesses últimos meses, o que nos parecia uma boa ideia tomou caráter de urgência.
Façamos da necessidade uma virtude e coloquemo-nos a tarefa de atualizar os desafios do passe. Deixemo-nos ensinar pela experiência.
Recebam minhas mais afetuosas saudações,
Anna Aromí
Secretária do Passe da AMP
Barcelona, 6 de janeiro de 2022