skip to Main Content

La interpretación lacaniana

Glacy Gorski (coordenadora)
Alice Tocchetto, Aluska Cavalcanti, Anícia Ewerton, Gabriella Dupim, Isadora Grego D`Andrea, Januário Marques, Lia Giraldo Augusto, Lídia Pessoa e Pauleska Nóbrega.

O GT se dedicou ao estudo, mais especificamente, do capítulo XIII, sem perder de vista outros capítulos do curso de Jacques-Alain Miller, Todo el mundo es loco. No seu curso, ele constata que, na sociedade contemporânea, há um crescimento do discurso da ciência, da tecnologia, do consumismo, da política – na perda do estado de direitos – e do crescimento dos movimentos cognitivistas. Ele assinala o avanço das práticas de avaliação que aprisionam o sujeito em classificações, afirmando que o sujeito, segundo Lacan, “não é susceptível de categorização” (tradução nossa, MILLER, J-A, 2015, p. 137).

O discurso analítico é distinto de uma prática que se pauta em uma escala de valores e em um discurso da quantificação. A promessa e o desafio da psicanálise, frente ao mundo contemporâneo, é mostrar que ela é uma experiência de fala, saber, verdade e gozo, singularizando os sujeitos, ao contrário da categorização universal.

No capítulo XIII, Miller se dedicou a discorrer sobre a maneira que Freud interpretou a psicanálise, detendo-se mais na interpretação lacaniana, no que tange o seu ultimíssimo ensino. Procuramos debater sobre o questionamento de Lacan sobre a compreensão de que a psicanálise seria uma experiência de verdade. Segundo Miller, parece que Lacan busca introduzir a concepção de que esta seria uma experiência de satisfação, pois, segundo Lacan, “não há verdade que ao passar pela atenção, não minta” (tradução nossa, MILLER. J-A. , 2015, p. 240).

No ultimíssimo ensino, segundo Miller, ele nos leva a repensar a sua afirmativa de que: “Eu, a verdade, falo”. Miller esclarece que, a partir do ultimíssimo ensino, essa frase precisa ser lida como tendo o sentido diferente do sujeito suposto saber, afirmando que “O sujeito que se anuncia como verdade” (tradução nossa, MILLER, J.-A. , 2015, p.241) é aquele que permite se surpreender. Tal afirmativa nos remete à fala do analisante, a qual acontece de maneira líquida, assim, desse modo, é possível a enunciação, a qual tem a ver com certa “in – atenção” – pois é na experiência desatenta que o verdadeiro pode vir à tona. Freud já recomendava que só é possível uma análise se houver a associação livre, concluímos que ele já apontava para a liquidez. Lembramos, ainda, que, do ponto de vista do analista, Freud também pontua que a interpretação só acontece, se houver a atenção flutuante (FREUD, 1912). É ela que possibilita que a interpretação verdadeira possa emergir, uma vez que só acontece na surpresa e no momento oportuno. Diante das questões da nossa época, Miller se apropria da noção de liquidez para pensar a psicanálise – lembremos que o termo “liquidez” foi empregado por Bauman para falar de uma sociedade líquida. Assim, vale destacar que Miller traz, para a psicanálise, essa temática, dizendo que é exatamente a liquidez que promove a palavra que escorre livre da comunicação.

Miller, já no cap. XII, fala da bipartição da psicanálise, pensada em duas vertentes: de um lado, a decifração do inconsciente, repensada por Lacan a partir da linguística estrutural; de outro lado, a teoria das pulsões. Ele sublinha a oscilação entre dois momentos: em um, os dois níveis, a saber, do significante e da pulsão, articulados por um automatismo, por um algoritmo – nesse momento, ele destaca a incompatibilidade do desejo com a palavra; em outro momento, da oscilação, ele aponta que há um hiato entre o sentido e o gozo, uma inadequação do significante ao real.

Concluindo, podemos afirmar, então, que a palavra é líquida desde o início da análise, mas está habitada por um algoritmo, que estrutura o inconsciente como uma linguagem. No início da análise, está a prática da decifração do inconsciente; ao final, está a pulsão, cingida de significação. Há uma estrutura de nó que não está articulada ao sentido – esse nó é uma amarração em três, é contingente, tem a ver com a emergência do real e se constitui de forma líquida.


REFERÊNCIAS
FREUD, S. (1912) Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise. In: Edição standard das obras psicológicas completas de S. Freud, v. 12, Rio de Janeiro: Imago, 1972.
LACAN, J. Proposição de 9 de Outubro de 1967 sobre a psicanálise da Escola. In: Outros Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
MILLER, J.-A. Todo el mundo es loco. Buenos Aires: Paidós, 2015.
___________   A formação” do analista, In: Opção Lacaniana, nº37. São Paulo: Ed. Eolia, setembro 2003, pp. 3-34.
Back To Top