O estilo que faz Escola Késia Ramos (EBP/AMP) Esses tais artefatos que diriam minhas angústias,…
Contingência e Determinação
Anamaria Vasconcelos (coordenadora)
Ana Paula Mota, Larissa Souto, Maria Verônica da Silva, Rosa Feitosa, Sílvia Gusmão (relatora), Socorro Soares, Taciana Mariz, Vivianne Lafayette, Zélia Santos
A partir da proposta feita pelo Conselho Deliberativo da EBP/NE para o Seminário de Orientação Lacaniana, em torno do curso de Miller, Todo el mundo es loco[1], colegas foram convidadas pela coordenação que organizou um GT tomando como base a aula X – Contingência e determinação. Nesta pesquisa, exploramos um real que Miller encontrou na contingência e o binômio do título por diferentes perspectivas: discurso amoroso, constituição subjetiva e experiência analítica.
Nesse caminhar, a coordenadora com sua escuta atenta, a oferta de textos e a convocação, diante de nossos impasses, a seguirmos em frente em nossas questões, colocou-nos a trabalho, fazendo de nossos encontros momentos de discussões vivas e animadas. Como consequência desse trabalho, tiramos uma elaboração intitulada Contingência e trauma, a qual segue abaixo.
Na aula X, Miller comenta a mudança de rumo que faz Lacan passar da psicanálise orientada pelo simbólico para dar destaque à contingência, portanto, à dimensão do real, que faz o acontecimento primeiro. Isto significa dizer o acontecimento que inaugura o gozo, determina a posição subjetiva, fundamenta a direção da cura. Qual é a relação da contingência com o trauma?
No primeiro tempo do seu ensino, Lacan privilegia as leis da linguagem, a cadeia significante, cujos efeitos são determinantes para a constituição do sujeito. Com a virada no Seminário 11, Os quatros conceitos fundamentais da psicanálise, Lacan reformula a noção de sujeito, quando adota o termo falasser, renuncia a referência ao significante em prol da concepção de causa, denominada, mais tarde, contingência. Nesse nível, não há sujeito.
Sobre a contingência, nada se sabe previamente. É um acaso, um jogo aleatório. Remete ao incalculável, ao caos, em contraposição à ordem[2]. No nível da contingência, há trauma. Trata-se do encontro contingente do significante com a carne viva; o Um de gozo. Esse acontecimento dá lugar a uma escritura, ali onde não havia nada escrito. A partir daí, será estabelecida uma ordem, uma lei que comanda a repetição, na qual o falasser é capturado. Assim, os significantes que vêm depois têm algo dessa primeira marca e tendem a se repetir.
Na clínica, a repetição da marca inaugural evidencia-se nas ressonâncias que ecoam no corpo, na iteratividade do Um de gozo. Este é o ponto do trauma: onde se goza. A experiência analítica de orientação ao real cerceia o modo de gozar, para que seja possível dar contorno ao gozo sem sentido, gozo do Um, que não aparece na fala, mas “no fazer do sujeito, na repetição, no seu modo de vida”[3].