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Lançamento do livro Lacan Chinês: para além das estruturas e dos nós, de Cleyton Andrade

Francisco Santos

No último dia 7 de novembro, a Comissão de Biblioteca da EBP Seção Nordeste trouxe mais um Noites de biblioteca, onde tivemos a honra de apresentar o livro Lacan chinês, uma obra reconhecidamente importante para a psicanálise de orientação lacaniana. E não apenas: o livro ganhou o primeiro lugar do 58º Prêmio Jabuti, na categoria Psicologia, Psicanálise e Comportamento; e é oriundo da pena – ou do pincel – de Cleyton Andrade.

Para conversar com Cleyton, convidamos também Fabián Fajnwacks: psicanalista, membro da Escola da Causa Freudiana de Paris e da Escola da Orientação Lacaniana, da Argentina e professor na Universidade Paris VIII Vincennes Saint-Dennis. Além de escrever um dos pósfácios desta edição revista e ampliada, ele é o autor do recém-lançado Despatologizar o sujeito trans e outros ensaios lacanianos. Fabián conversou conosco diretamente da França, e por isso nosso horário precisou ser modificado.

Fabián complementou, através de suas próprias pesquisas e articulações entre psicanálise, linguística e filosofia, não somente o aspecto intelectual da produção acadêmica de Cleyton, reverberada e corroborada através de diversos autores citados, bem como o caráter clínico que o livro provoca e que foi provocado: “porque em psicanálise o escrito não precede à palavra, e sim deposita-se através do que se diz”[1]. Essa ressalva rima com outra que insiste nessa faceta moebiana que o autor faz da produção literário-acadêmica e da clínica: “[que] cada analisante possa encontrar sua própria lalínguai, sua lalíngua chinesa naquilo que diz, a partir das descontinuidades entre S1 e S2 e reversibilidades que permitam equivocar a língua que herdou do Outro”[2].

O psicanalista que se diga lacaniano, ainda que experiente, não somente o neófito, ao passar por seminários como o Livro 18, De um discurso que não fosse um semblante, onde o tema chinês aparece tão evidente, desde a própria capa, pode se perguntar: Por que uma língua tão diversa, discrepante como a chinesa – aos olhos do ocidental – interessa a Lacan?

Debatemos pouco sobre isso, em meio a tantas questões da contemporaneidade, levando também em conta um ensino tão extenso e intenso quanto o de Lacan. A obra que temos em mãos vai nos dizer, contudo, que a escrita e poesia chinesas não apenas interessaram a Lacan, mas compuseram partes fundamentais de seu pensamento e de seu ensino, ou seja, de tal influência somos todos, aqui, tributários.

Ler o Lacan chinês de Cleyton me deu a impressão de ler três obras: uma de história da filosofia, acompanhando a trajetória dos pensamentos e pensadores em uma terra, um país, unificado, reunificado, dividido, uma vasta história de transformações que parecem ter como fio condutor sua escrita e poesia. Pois, “cada língua responde às condições dos povos que as sustentam”[3]. Senti que lia algo como uma sinologia filosófica.

Segundo, também é um tratado de linguística, um estudo aprofundado da escrita, caligrafia, poesia, pintura chinesas, e como essas expressões de um povo e uma cultura são sua essência e que tanto podem ensinar aos ocidentais e sua mania de continuidade.

A poesia chinesa que corta e produz efeito de furo e sentido como uma interpretação lacanina. Uma investigação que vai fundo e elucida toda uma sorte de questões que boa parte de nós nem mesmo chega a levantar, por exemplo, “que há uma ironia em encontrar o valor da letra numa escrita que não possui letras”, referindo-se a como Lacan encontrou e formulou de maneira inescapável – não faria alhures – no seu percurso através da poesia e escrita chinesas o conceito de letra.

E um terceiro, o trabalho de um psicanalista, já marcado no título, “para além das estruturas e dos nós”. Como ele mesmo explica ao final da obra, é clínico o ponto de partida para este trabalho teórico, trabalho através do qual encontra e demonstra a marca indelével, inegável e inerente à construção de um sistema de pensamento, de um ensino como o de Lacan, que não seria o mesmo sem sua imersão na cultura chinesa; o que o fez, de fato, um Lacan chinês.

[1] FAJNWACKS, Fábian. A urgência de ser chinês hoje! In: Lacan chinês: para além das estruturas e dos nós. 3. Ed. Rev Amp. Belo Horizonte, Autêntica, 2023, p. 227.
[2] FAJNWACKS, Fábian. A urgência de ser chinês hoje! In: Lacan chinês: para além das estruturas e dos nós. 3. Ed. Rev Amp. Belo Horizonte, Autêntica, 2023, p. 231.
[3] ANDRADE, Cleyton. Lacan chinês: para além das estruturas e dos nós. 3. Ed. Rev Amp. Belo Horizonte, Autêntica, 2023, p. 67.
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