Tereza Christina Lyra
Pela via do sinthoma, como podemos ler a relação do falasser com o mundo? Esta foi a questão do Eixo 2 para o Encontro Preparatório da III Jornada da Seção Nordeste e colocou a trabalho o grupo coordenado por Gisella Sette e Sílvia Farias e composto por Ângela Pinto, Januário Marques, José Ronaldo de Paulo, Maria Carolina Queiroz e Tereza Christina Lyra.
Os desafios da clínica contemporânea, à luz do último ensino de Lacan, movimentaram as discussões e provocaram um desejo em torno do tema.
A apresentação, na noite de 19 de setembro de 2023 — com a coordenação de Susane Zanotti, seguido de um chamamento de Cláudia Formiga, convocando a participação para a III Jornada —, teve início com um vídeo ao som da música de Marisa Monte. As imagens ilustraram a função que teve a obra como suplência na vida do Profeta Gentileza, que pintou as pilastras do viaduto do Caju, no Rio de Janeiro, e conclamou o exercício da gentileza.
O argumento, construído pelo grupo, e apresentado por Ângela Pinto, destacou o acontecimento originário do encontro da carne com o significante na relação do falasser com o mundo, e a importância do sinthoma que então se constitui.
As consequências da contemporaneidade líquida e do declínio da referência paterna nas manifestações sintomáticas do falasser são a base para alguns dos questionamentos: como dar conta da iteração e do ilimitado do gozo fora do discurso? Como chegam à clínica os novos sintomas, como operar e como levar adiante a ética da singularidade?
Pedimos emprestado a Lenine e Carlos Rennó a poesia para melhor dizer do vivo que habita o falasser.
Precário, provisório, perecível. Falível, transitório, transitivo.
Efêmero, fugaz e passageiro. Eis aqui um vivo, eis aqui um vivo. [1]
O vídeo — produzido por José Ronaldo — trouxe, pela plasticidade das imagens, o vivo da experiência analítica.
A seguir, Gisella comentou a escolha para apresentação de dois fragmentos de casos clínicos de Fabián Schejtman a partir de perspectivas distintas: psicose e neurose.
Os casos apresentados por Sílvia Farias e Carolina Queiroz ilustraram, por meio da clínica nodal, como é possível fazer a leitura pela via do sinthoma da relação do falasser com o mundo.
Algumas questões clínicas foram destacadas.
Tereza Christina interrogou a potência da palavra quando há declínio do simbólico e como operar para que ela toque o gozo. José Ronaldo ressaltou a diferença no modus operandi do behaviorismo, da terapia cognitivo comportamental e da psiquiatria que trabalham no sentido de um bem-estar universal, enquanto a psicanálise, pelo contrário, acolhe o que há de mais singular no sujeito. Januário Marques pontuou que o mutismo do gozo encarnado no corpo deixa ressonâncias no cotidiano e pergunta: o acontecimento de corpo está ligado ao gozo feminino ressoando no corpo?
As intervenções da Comissão Científica e demais participantes animaram a discussão, concluindo que os sintomas e sinthomas são flexíveis e mutáveis e que os enodamentos e amarrações vão se sucedendo para dar conta do desafio de viver em tempos líquidos.
Não acabado, não definitivo; incerto, incompleto, inconstante; instável, variável, defectivo.
O que mais vale a pena é estar vivo; não feito, não perfeito, não completo; não satisfeito nunca, não contente; não acabado, não definitivo. Eis aqui um vivo, eis-me aqui. [2]