Vânia Ferreira
Rumo à III Jornada da Seção Nordeste, apresentamos, no dia 03 de outubro, o Eixo 3, coordenado por Vânia Ferreira e Lídia Pessoa. A atividade teve como questão O que está em jogo na política Lacaniana se nos referirmos a ela como acontecimento de corpo? Foi mediada por Cláudia Formiga e contou com um considerável número de participantes, que animaram a noite de forma entusiasmada.
Política lacaniana e acontecimento de corpo foram as duas expressões significantes extraídas dessa pergunta, na qual perpassaram nossas discussões. Os colegas Francisco Santos e Rose Mooneyhan, Anícia Ewerton e Isadora D’Andrea, além de Paulo Carvalho se juntaram ao Eixo e se puseram a trabalhar de forma decidida.
O inconsciente é a política, axioma lacaniano pronunciado em maio de 1967, nos guiou nesse debate. Desde Freud, conhecemos o sujeito como um ser social, coletivo. Esta dimensão se confirma em Lacan quando constrói os aforismas: o inconsciente é estruturado como uma linguagem ou o desejo é o desejo do Outro. Mas, ao longo do seu ensino, ultrapassa a concepção de laço social fundado na identificação tal qual pregou Freud para o inconsciente não apenas como discurso do Outro, mas como trauma de lalíngua sobre o corpo, gerando o acontecimento de corpo e uma inscrição de gozo.
Por um lado, Paulo Carvalho destacou a torção que se deu desde a política é o inconsciente para o inconsciente é a política. Pois tal inversão nos diz que o inconsciente não parte mais do Pai, mas do inconsciente como algo que está “a ser definido”, como disse Miller.
Dessa forma, essa transformação nos prepara para a clínica do acontecimento de corpo. Sublinhando que, aqui, trata-se do corpo falante, este que foi afetado por lalíngua e que escapa ao sentido.
Isadora e Anícia, então, privilegiaram as questões sociais, elucidando o racismo e a segregação, elevando o dito de Lacan ao afirmar que o analista deve estar à altura da subjetividade de sua época.
Do ponto de vista clínico, esse sintagma foi demonstrado por Lídia, quando trouxe o caso clínico de Susanne Hommel — paciente atendida por Lacan —, cujo corpo foi afetado pelos significantes do seu tempo: o horror do nazismo. Pela via da arte, ainda, Lídia fez alusão aos parangolés de Hélio Oiticica.
Rose Mooneyhan articulou a política ao discurso capitalista e científico, abordando a medicalização e a universalização que tem no seu horizonte o para todos — felicidade para todos.
Finalmente, Francisco Santos trouxe o analista como um fato político, se perguntando: o que o analista tem a ver com a política? E em que ele pode se implicar, para além dos consultórios?
Nossa noite, aliás, foi animada pelos vídeos construídos por José Ronaldo e Severino Bernardino que nos brindaram desde a música de Caetano Veloso, Gente, onde destacam-se os corpos — um a um — revelando, assim, o singular no cenário político da cidade, até o recorte do filme Um encontro com Lacan no qual o depoimento de Susanne Hommel foi destacado sobre o ato (político) de Lacan ao equivocar o significante Gestapo em gest à peau.
Por fim, a arte de Hélio Oiticica encerrou esse mosaico que foi a articulação entre o inconsciente, o político e o acontecimento de corpo.
Com os agradecimentos a Cláudia Formiga, Eliane Batista e Susane Zannoti. Convidamos todos ao trabalho rumo à III Jornada de Seção Nordeste.