Eixos Temáticos

Eixo III – O que está em jogo na política lacaniana se nos referirmos a ela como acontecimento de corpo?

Responsáveis: Lídia Pessoa (AMP/EBP) e Vânia Ferreira (Aderente Seção Nordeste)

 

“Gente é um lugar de se perguntar o um

Das estrelas se perguntarem se tantas são

Cada estrela se espanta à própria explosão”.

                     (Caetano Veloso, Gente. 1977)

Por que trazer hoje na III Jornada da Seção Nordeste a discussão da política na psicanálise? Na década de 60 do século XX Jacques Lacan introduziu a dimensão da política à psicanálise no Seminário a lógica da Fantasia: “…se dirá não digo mesmo “política é o inconsciente, mas simplesmente, o inconsciente é a política”[1]. De que política se trata?

Jacques Alain Miller explica que “o inconsciente é a política” quer dizer que o inconsciente provém do laço social”. Indica nessa passagem, que a existência da sociedade se dá porque a “relação sexual não existe”[2].

Éric Laurent, ao considerar que a política mostra uma falha[3], considera o ”acontecimento de corpo” no “inconsciente político” [4]. De que corpo se está falando? “O corpo é o Outro (….) O corpo é feito para inscrever alguma coisa que se chama marca. (…). E o primeiro começo do gesto de amor, é sempre mais ou menos esboço desse gesto”[5].

Como pensar a subjetividade e os laços sociais na nossa época para além das garantias das referências simbólicas e edípicas? Vê-se a sociedade hoje com os rios secos e envenenados, pais e mães angustiados com a violência sexual e urbana contra os filhos, consumismo excessivo, acontecimentos que reverberam nos corpos. Acontecimentos de corpo que testemunham a sintomatologia da nossa época.

Há um real no laço social, impossível de saber, mas que faz vibrar os corpos pois sua substância é o gozo. Nem tudo pode ser dito pela linguagem e as representações do mundo são incompletas. Diante do real, dessa dimensão impossível de dizer e a contingência, destina-se a política lacaniana. [6]  O inconsciente é o corpo falante e a sua “debilidade” o destina ao delírio. [7]

Como pensar o delírio generalizado sem a referência edípica? Como interrogar a proposta da cultura que se apoia num universal sustentada pelos discursos do mestre, do universitário e da histeria, cujo horizonte é a felicidade para todos? E o discurso da psicanálise seria também um delírio? Diante de tantas questões que articulam à política lacaniana o acontecimento de corpo, convidamos todos a contribuírem com seus trabalhos para avançarmos nesse debate.


[1] LACAN, J. 1966-67, aula de 10 de maio de 1967.
[2] MILLER, J.A. Intuições Milanesas II. Opção Lacaniana online, nº 6, nov.2011.
[3] LAURENT, E..  Entretien avec Éric Laurent, Línconscient et i’événement de corps, La Cause Du Désir, Revue de Psychanalyse 91, Navarin Éditeur, 2015. Em Ecos, Boletim da 25a Jornada EBP-MG.
[4] LAURENT, E.. O falasser político. Em O avesso da biopolítica: uma escrita para o gozo. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2016.
[5] LACAN, J. 1966-67, aula de 10 de maio de 1967.
[6] SANTIAGO, J. Acontecimentos políticos de corpo: o analista e a segregação. Em Correio, Revista da EBP. São Paulo: EBP, n.90, abril de 2023: 99.
[7] MILLER, J.A. O inconsciente e o corpo falante. Em Lacan Web Télévision, 2015.