Por Yolanda Vilela – Diretora de Biblioteca da EBP-Seção MG
O infamiliar, o intraduzível e o ilimitado do gozo feminino são três formas de abordar o que está fora do campo da representação. Podemos dizer, em uma primeira aproximação, que o infamiliar é o paradigma de tudo aquilo que atravessa o espelho como intrusão do mais estranho no mais íntimo, desvelando a dimensão do objeto que não se pode reconhecer. Em seu Seminário 10: a angústia, Lacan aproxima o aparecimento do infamiliar no campo da realidade do objeto a que designa, justamente, a presença do que foi libidinalmente investido e, ao mesmo tempo, extraído da forma imaginária do corpo.
O intraduzível, por sua vez, remete ao limite do trabalho de linguagem que caracteriza o inconsciente. A finalidade do trabalho do inconsciente é concebida por Freud, na “Carta 52” da Correspondência com Fliess, como um incessante trabalho de tradução do acontecimento traumático que é, em si mesmo, inassimilável. Esse limite simbólico se encontra também no âmago da escrita literária e da passagem de uma língua à outra, devido à impotência que é própria ao significante em sua função de designar a Coisa. O motor da atividade literária, assim como da atividade de tradução seria, nesse sentido, similar à tentativa de dizer o indizível e de traduzir o intraduzível.
Por fim, o gozo feminino, tal como elaborado por Lacan em seu Seminário 20: mais ainda, pode ser tomado como a marca de uma impossibilidade: essa de circunscrever o gozo do falasser nos limites do corpo e da significação fálica. Essa característica ilimitada do gozo feminino seria, desse modo, tão infamiliar quanto intraduzível.
É das articulações entre esses três termos – o infamiliar, o intraduzível e a dimensão ilimitada do gozo feminino – que a Biblioteca Aílson Braz Sena (EBP-Seção MG) pretende se encarregar a fim de fazer avançar a discussão do tema proposto para o XXIII Encontro Brasileiro do Campo Freudiano.
Para abordar o tema proposto, contaremos com a colaboração de Gilson Iannini, diretor da coleção “Obras Incompletas de S. Freud”, pela editora Autêntica. Essa atividade, prevista para o dia 1º de abril 2020, contemplará, entre outros aspectos, as especificidades da tradução “O infamiliar” para a expressão freudiana Das Unheimliche e suas possíveis articulações com gozo feminino, tal como Lacan o desenvolve no Seminário 20: mais, ainda.
Paralelamente, a equipe da Diretoria de Biblioteca da EBP-Seção MG vem investigando, em cartel recentemente formado, e com base no artigo de Freud: Das Unheimliche, as relações que podem ser tecidas entre o infamiliar, o intraduzível e o ilimitado do gozo feminino.