Por Patricia Badari
Dizer sobre uma Biblioteca de Escola pode ser uma proposta paradoxal. Mas tem sua lógica.
Se não há uma Biblioteca na EBP e sim as várias bibliotecas das Seções, pode se colocar como um equívoco dizer sobre uma Biblioteca de Escola. No entanto, este mesmo esclarecimento pode nos levar à outra equivocação, pois não se trataria de uma Escola – uma Escola Una.
Uma Escola é uma formação coletiva e só se sustenta como uma comunidade se cada um dos seus membros sabe sobre a natureza dos semblantes e se sabe que a natureza do Ideal, igual para todos, não é outra coisa senão uma causa para cada um, experimentada no nível de sua solidão subjetiva. Neste sentido, nos diz Jacques-Alain Miller [1], a Escola é um conjunto logicamente inconsistente; não há todo da Escola.
Esta comunidade, que chamamos de Escola, se sustenta de cada variedade, de cada diversidade, de cada multiplicidade em direção ao Um de uma Escola de Lacan, que é a orientação lacaniana – a relação com uma causa. Este Um recusa o “para todo x” e diz respeito ao um a um, de cada membro, de cada Seção, de cada Biblioteca.
Sendo assim, o Um e o múltiplo estão presentes em nossa orientação. E neste ano de trabalho, como a relação entre o Um e o Múltiplo se apresentou no trabalho de Biblioteca? Esta foi a pergunta lançada aos Diretores de Biblioteca das Seções na EBP.
Desde abril deste ano estes diretores começaram um trabalho e lá se vão oito meses. Assim, já podemos recolher o vivo desse percurso e nos interrogarmos sobre ele. Um a posteriori do que foi o trabalho em 2019 e as perspectivas para 2020, acrescentando-se nesse ano porvir a Seção Leste – Oeste (em formação), fruto da nova geografia que vem se desenhando na EBP.
Convido-lhes a ler como cada diretor de Biblioteca teceu seu trabalho.
Boa leitura!
[1] MILLER, J.-A. “Teoria de Turim”. In: Opção lacania online. Nova Série. Ano VII. N. 21. Disponível em: http://www.opcaolacaniana.com.br/nranterior/numero21/texto1.html
Por Bibiana Poggi
Diretora de Biblioteca da EBP Seção PE
O trabalho da biblioteca da EBP Seção PE procurou enlaçar o Um e o múltiplo tão próprio à Escola, a qual se compõe por meio da solidão subjetiva de cada Um. Assim sendo, a biblioteca, como espaço que sustentou o Um, em 2019, ocupou-se do estudo preparatório para o IX ENAPOL – ódio, cólera e indignação, desafios para a psicanálise.
O múltiplo, por sua vez, apresentou-se ao longo da atividade, constituindo-se como espaço de abertura para a inscrição de trabalhos para serem apresentados e debatidos, o que pôs a biblioteca como uma das “portas de entrada” para os participantes da Seção.
Por Milena Vicari Crastelo
Diretora de Biblioteca da EBP Seção SP
A pergunta feita por Patricia Badari me levou imediatamente a um questionamento se de fato se faz claro para mim o conceito de Um e Múltiplo de uma Escola.
Arrisco pensar o Um no que se refere à causa analítica, penso que aí podemos dizer do Um de uma Escola, a orientação que temos a partir da causa, e o Múltiplo se dá à medida que orientados pela causa analítica cada Seção possa a seu estilo fazer seu trabalho. O engajamento se dá um por um, mas com uma orientação. A banda de Moebius é uma imagem que me vem, pois não consigo ver o Um sem o Múltiplo, e o Múltiplo sem o Um, me parece que é um dentro e um fora, que se articulam e não se separam. Em seu discurso de posse, Angelina Harari, durante o congresso de Barcelona 2018, nos disse: “Significante lançado para barrar, em 1998, o retorno ao múltiplo, a dispersão do múltiplo, a Escola Una foi o instante de ver imprescindível para dar um passo em direção à unidade. A esse passo J.-A. Miller deu o nome de ‘Aufhebung da unidade’: ‘nossa unidade foi questionada, é um fato. Então, devemos reafirmá-la’, dizia ele, colocando em epígrafe o significante Escola Una. ‘[…] O Um expressa-se para nós no que chamamos, sem tê-lo conceitualizado, de orientação. A orientação, e não o standard. E o Múltiplo? Diferentemente da IPA, para nós não é separado do Um’” [1].
Durante este ano de gestão trabalhei para fazer de nossa biblioteca um lugar vivo onde possamos nos encontrar com a letra de Freud, Lacan, Miller e tantos outros autores da Psicanálise de Orientação Lacaniana. Uma Biblioteca viva e vivificante seguindo a orientação que temos da FIBOL e que vem sendo a orientação praticada na EBP. As atividades pensadas a partir dessa orientação se fizeram dentro e fora da Seção, pudemos trabalhar a letra de autores do campo freudiano através de suas publicações e estar na cidade, em espaços públicos, conversando com a literatura e com a arte, como diz Laurent “Reencontrar lugares onde se possa debater de um modo exigente e vivo é reencontrar a devida relação frente à demanda técnica que nos assalta. Não podemos, simplesmente, dizer ‘Não!’, e nos perdermos em um isolamento esplêndido. É preciso, às vezes, dizer ‘sim!’ e ‘não!’” [2].
[1] HARARI, A. “Discurso de posse da nova presidente da Associação Mundial de Psicanálise (AMP). Disponível em: https://www.wapol.org/pt/articulos/TemplateArticulo.asp?intTipoPagina=4&intPublicacion=26&intEdicion=1&intIdiomaPublicacion=9&intArticulo=2817&intIdiomaArticulo=9
[2] LAURENT, É. “Reflexões sobre a forma atual do impossível de ensinar”. In: Correio Express. Revista online da Escola Brasileira de Psicanálise. nº 4, São Paulo, 2018.
Por Andrea Vilanova
Diretora de Biblioteca da EBP Seção RJ
Entre o Um e o múltiplo no trabalho da Biblioteca.
A composição de uma comissão de trabalho, a partir do desejo decidido de seus participantes, traz a marca daquilo que se modula entre o Um e o múltiplo na Orientação Lacaniana. Se na política da psicanálise a direção é o singular, cada um, como peça avulsa, está às voltas com a invenção de um lugar junto aos demais, sem que isso faça conjunto, todos sustentados pela transferência de trabalho.
Nos enlaces cotidianos em torno de tarefas e produções regulares ligadas à biblioteca e à Seção Rio, tenho recolhido o valor dos desenlaces. Experimentamos a importância da circulação de tarefas entre as colegas de comissão, em arranjos de pequenos grupos, novos a cada vez, com novas composições. Transitar em meio aos impasses e possibilidades que cada um oferece ao nosso trabalho coletivo – o fazer Escola – encontrou na última publicação de Arquivos da Biblioteca um retrato dessa pulsação.
Por Ana Stela Sande
Diretora de Biblioteca da EBP Seção BA
Parece-me que no que se refere as Bibliotecas, o Um e o Múltiplo se apresenta no desafio de fazer circular o que se produz no Campo Freudiano, pois é a circulação das nossas produções que vai tornar possível a transmissão da psicanálise e manter vivo o legado de Freud e Lacan.
Produzir em grande quantidade e qualidade, dar testemunho da clínica é uma marca da nossa Escola, um Uno, fazer com que essa produção seja transmitida não é uma tarefa fácil em tempos de informação em excesso e internet acessível a quase todos.
Por Louise Amaral Lhullier
Diretora de Biblioteca da EBP Seção SC
A meu ver, em 2019, o trabalho de Biblioteca fortaleceu a direção ao Um quando a Diretoria decidiu avançar no projeto de funcionamento em rede que teve seu início há mais de uma década, com a adoção do sistema PHL (Personal Home Library), que veio viabilizar a disponibilização, o acesso e o compartilhamento de catálogos de publicações do acervo. Por outro lado, quando da implantação do PHL, algumas bibliotecas da EBP já estavam organizadas à sua maneira, tanto no que se refere ao sistema de classificação [1] quanto à indexação de assuntos, o que dificulta o funcionamento em rede, apontando para o Múltiplo.
Caso seja efetivada a uniformização pretendida, estaríamos eliminando uma dificuldade para o funcionamento em rede destacada pelos nossos bibliotecários. Avançaríamos, portanto, na direção do Uno da Escola. Outro passo importante seria a produção de um Thesaurus em Português, a partir do qual pudéssemos organizar a indexação por assunto de tal forma que a localização das referências bibliográficas nas diversas bibliotecas seria não apenas mais fácil, mas também mais frutífera. O Thesaurus adotado pela ECF pode e deve ser um ponto de partida, mas podemos ampliá-lo.
No que se refere à Biblioteca da Seção Santa Catarina, a orientação para o Um tem se traduzido em convites a colegas autores do Campo Freudiano para que venham apresentar seu trabalho em Noites de Biblioteca. Além disso, mantemos como meta atualizar nosso acervo incorporando ao mesmo todas as publicações em Português dos membros da Escola, o que estamos efetivando na medida de nossa disponibilidade de recursos financeiros. A biblioteca da Seção SC segue mantendo contato frequente com as das Seções Minas Gerais e Rio de Janeiro, solicitando ou enviando publicações. Essa troca é viabilizada pelo fato de termos o acervo da rede disponível online pelo sistema PHL, que permite localizar o que o usuário pesquisa em todas as bibliotecas da EBP. O incremento dessas trocas é muito desejável para o incremento da circulação dos textos mais difíceis de obter, como os de circulação restrita (“inéditos”), os que foram publicados em cadernos e atas de eventos, livros esgotados e similares
[1] N. A.: Haviam acervos organizados de acordo com sistema próprio de classificação, assim como a adoção de sistemas de classificação diferentes – algumas CDD (Classificação Decimal de Dewey), outras CDU (Classificação Decimal Universal).
Por Yolanda Vilela
Diretora de Biblioteca da EBP Seção MG
As atividades da Biblioteca da EBP Seção MG, em 2019, tiveram como norte o Uno próprio da Orientação Lacaniana. Privilegiamos, nos seminários oferecidos pela Biblioteca, o tema do próximo Congresso da AMP (Buenos Aires, 2020). Esses seminários contemplaram, ao mesmo tempo, o tema da XXIII Jornada da EBP Seção MG, sobre o tema do tempo, etc.
Todas as atividades da Biblioteca incluíram, em suas propostas, “membros” e “não membros” da EBP. A inclusão de não membros foi, para nós, ocasião de transmissão das principais diretrizes da orientação lacaniana, sejam elas epistêmicas, clínicas ou políticas. Essa inclusão (seja pelo viés das demandas endereçadas à Biblioteca, seja por convites feitos pela Biblioteca) de não membros nas atividades da Biblioteca é representativa da nossa aposta na transmissão da psicanálise de Orientação Lacaniana, e não, ao contrário, uma forma de tratar o Múltiplo (que em 2019 não constituiu algo que exigisse um esforço a mais por parte de nossa Diretoria de Biblioteca).
Por Bartyra Ribeiro de Castro
Diretora de Biblioteca da EBP Seção Leste – Oeste (em formação)
A EBP Seção Leste – Oeste (em formação), tem se deparado com o desafio de criar uma biblioteca única para as três localidades que a compõem. No decorrer desses anos de funcionamento como Delegações, via Associações criadas para dar suporte jurídico, foram desenvolvidas Atividades de Biblioteca seguindo a orientação da EBP.
Verificamos que, em 2019, não houve Atividades de Biblioteca em qualquer destas Delegações/Associações.
O primeiro passo da Diretoria da Seção será produzir um programa único com reuniões compartilhadas nos seus três territórios. Em seguida, e já em fase de pesquisa, buscaremos propor soluções para a criação da biblioteca única.