Não conheci bem Serge Cottet, nunca estive entre seus amigos – que não são poucos aqui no Brasil. Assisti suas aulas no curso de DEA de Paris 8, sessões clínicas no Hospital em Villejuif e creio que não perdi nenhuma de suas palestras aqui no Rio.
Durante a semana que transcorreu após sua morte, lemos homenagens que atestam de forma emocionante o lugar de Cottet no país da psicanálise.
Articulava como ninguém a prática lacaniana atual com o texto de Freud. Seu rigor epistemológico, sempre a serviço da clínica, é comparável à arte do bom cozinheiro que sabe cortar o animal na junta. Não dissecamos com facas, mas com conceitos, afirmou Lacan na célebre metáfora. Dessa forma, Serge Cottet estabeleceu “um pouco de ordem” na “miscelânea constituída pelos estados depressivos”, num texto de 1985 que é necessário ainda hoje. Sua escuta no cartel do passe em meados dos anos 1990 interrogou o lugar da interpretação nas análises concluídas, abrindo um tempo de trabalho a respeito. Seu enunciado “declínio da interpretação” despertou “uma comunidade adormecida nas certezas”. Sua precisão sobre temas clínicos como o despertar da puberdade, a neurose obsessiva feminina, entre outros, permanecerá como referência da epistemologia da clínica psicanalítica.
E que falta ele nos fará para dissecar os imbróglios que teremos que lidar adiante.
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