Vídeo em homenagem ao Bloomsday

O dia 16 de junho, Bloomsday, tem sido comemorado mundialmente e não podíamos deixar de também fazer nossa homenagem e assim convidamos a todos a mergulhar na arte joyceana, através da entrevista feita com Ram Mandil e da preciosa interpretação de Ana Kfouri, de alguns trechos do monólogo de Molly Bloom.

Boa imersão!

Por Ruth Helena Pinto Cohen

Noite da Biblioteca com Gilson Iannini

Ainda tendo a letra como âmago de nosso trabalho, estamos sob os efeitos da memorável noite de biblioteca, com a participação de nosso colega mineiro, Gilson Iannini que nos brindou com comentários sobre o Além do Princípio do Prazer, em sua edição crítica bilíngue. Destaco o final do texto, quando Freud nos aponta o caminho possível à psicanálise: “O que não podemos alcançar voando, precisamos alcançar mancando” e finaliza “A Escritura diz: mancar não é pecado”. Trecho este citado por um judeu ateu, que se inspirava no poeta alemão Rückert tradutor do Alcorão, e, assim, tenta se desculpar por ter largado, de certa forma, a mão da ciência e trazer à cena analítica a pulsão de morte recorrendo à poesia mítica.

Por Ruth Helena Pinto Cohen
Diretora da EBP-Rio

VISTA CHINESA – (o que o livro de Tatiana Salem Levy nos ensina sobre o tratamento do trauma)

Por Maria Inês Lamy

 Na epígrafe de A chave de casa[1], encontramos um poema de Emily Dickinson:

“Dizem que o tempo ameniza.

Isto é faltar com a verdade.

Dor real se fortalece

Como os músculos, com a idade.

 

É um teste no sofrimento

Mas não o debelaria.

Se o tempo fosse remédio

Nenhum mal existiria”

Vista chinesa[2], de Tatiana Salem Levy, é um livro belo, contundente, que tenta transmitir uma experiência traumática e seus efeitos. Julia, em seu trajeto cotidiano, familiar, vive horas de terror quando se vê submetida a um homem que a estupra e que, quem sabe, pode vir a matá-la. O Unheimlich emerge em meio à sua rotina conhecida. Diz a narradora: “Um trauma interrompe tudo ao seu redor, interrompe o próprio mundo, embaralha o tempo, a memória, e você é arrastada para fora da paisagem”[3]. E prossegue: “Um combate entre o corpo que já não era meu e o corpo que nunca tinha sido tão meu”[4]. O corpo revela-se estranho, mesmo mantendo-se intimamente seu, e Julia é ejetada da paisagem, de seu enquadramento habitual. O sujeito e o Outro são abalados. Ela chega a pensar: “E se eu fingir que nada aconteceu? Se eu me convencer que nada aconteceu? Que foi só um pesadelo”[5]. Mas Julia e seu corpo sabem que não é assim: as lembranças tétricas a rodeiam, o sexo forçado, os sons, o tom de voz do agressor, os socos, as luvas, os cheiros… Um caminho árduo de elaboração se inicia e é retratado no livro com verdade e quase crueza. Não há como apagar as marcas, sendo impossível retornar a um antes. Julia esquiva-se das demandas e conselhos da família e dos amigos e segue solitária em seu trabalho de elaboração. Com o terror íntimo, ou melhor, êxtimo, só ela poderá se haver. Continue lendo “VISTA CHINESA – (o que o livro de Tatiana Salem Levy nos ensina sobre o tratamento do trauma)”

A extração como função da escrita em Vista Chinesa: “são os detalhes vão me livrar do todo”[1]

Por Clarisse Boechat

“A escrita é corpo para mim”
Tatiana Salem Levy

“Vista chinesa”, livro de Tatiana Salem Levy, tem como ponto de partida o caso real de estupro ocorrido a sua melhor amiga, Joana Jabace. Ele expõe a densa tessitura entre trauma, luto, memória, amor, esquecimento: a re-escrita de um corpo violado pela catástrofe. Vida e morte se enodam em sua escrita, a linguagem se lapida para dizer desse inominável. A escrita como tratamento a esse inominável foi o ponto que me interessou levar para a conversa com Tatiana, na Noite promovida pela Diretoria de Biblioteca, junto às colegas Ana Beatriz Freire e Maria Inês Lamy.

Existe uma discussão conhecida na literatura, em especial pós-Shoah, que interroga de que modo um desastre se escreve se ele não admite por definição, escrita ou representação. Como se a violência extrema conjugada com a ausência de sentido, transbordasse sempre, resistindo à escrita e revelando um caroço de real que subsiste à representação. Ao ler “Vista Chinesa” eu interrogava o modo como a escrita de Tatiana se moldava perante o excesso inapreensível do estupro. Pareceu-me genial que nesta cena, excepcionalmente, a escritora tenha sido levada a encontrar uma solução estética, um recurso narrativo que foi o abandono da pontuação. Isso só acontece ali. O traumático se escreve como uma devastação em bloco, monólito sem fissura: Continue lendo “A extração como função da escrita em Vista Chinesa: “são os detalhes vão me livrar do todo”[1]”

Noite da Biblioteca com Armando Freitas Filho – Apresentação

Apresentação – Por Viviane de Lamare

Gostaria em primeiro lugar de agradecer o convite feito por Ana Beatriz para coordenar a atividade da Biblioteca sobre o tema do X Enapol – o Amor.  Graças ao convite feito por Jeanne Marie Costa Ribeiro a Armando Freitas Filho poderemos ouvir a leitura de seis poemas escolhidos pelo próprio autor. Quero dizer que é uma honra coordenar esta conversação, já que o poeta é um dos mais importantes de nossa literatura.

Faço agora uma breve apresentação do poeta.

Armando Freitas Filho nasceu no Rio de Janeiro em 1940. Poeta decidido desde muito jovem, aos quinze anos já escreve. Foi um leitor encantado por Manuel Bandeira e nos diz o porquê:

“Quando eu era adolescente, ganhei um disco de vinil. Do lado A tinha Manuel Bandeira, que naquela época era o poeta consagrado com justiça, e do lado B havia Carlos Drummond de Andrade, que era considerado difícil, encrencado”.

Passa a ler Drummond: “O que me fascina em Drummond é que mais changeant do que ele não há. Drummond tem índice de releitura infinito e, com o passar da vida, a poesia dele vai se transformando com você. Parece que aqueles textos que você conhece há anos ganham um significado atual, moldam você, continuamente. Porque, além de tudo, a figura dele é um claro enigma”.

Bandeira, Drummond e João Cabral – a Santíssima Trindade como os chamava, ou os três mosqueteiros, incluindo Ferreira Gullar como D’Artagnan.

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Noite da Biblioteca – A Poesia de Armando Freitas Filho

Isabel Lins

 Queria agradecer a presença de todos e de todas. Não vou dizer todes, não esperem isso. E agradecer especialmente a Ana Beatriz Freire, diretora da Biblioteca, por este convite. Achei uma felicidade convidarem o poeta Armando de Freitas Filho para escutarmos e comentarmos nesta noite, que também é preparatória para o Enapol. Então, aqui ficam os meus agradecimentos.

Eu queria ainda, fazer uma pequena homenagem à nossa querida Leda Guimarães, que faleceu há pouco. Aliás, a primeira data para este encontro coincidiu, infelizmente, com a morte dela e a Escola entrou em luto. Leda foi diretora da Biblioteca na gestão de Fernando Coutinho. Foi uma diretora muito produtiva, teve muita iniciativa e eu me lembro que no Enapol daquele ano a Biblioteca foi escolhida a melhor do Brasil – ou da América Latina, não posso precisar –, então queria prestar essa homenagem a Leda que tanto se dedicou ao pensamento psicanalítico e à nossa Escola.

Resolvi compactar esta minha fala porque, sobre Armando, a gente teria um mundo de palavras a usar, pronunciar, falar. Vou, pois, me restringir, até por uma questão de tempo, já que ainda teremos a fala de Paulo Vidal, teremos ainda alguma recitação de Armando e colegas que queiram se manifestar.

Há um provérbio espanhol que Octavio Paz (Marcel Duchamp ou o castelo da pureza, terceira edição, 2002, p.24) cita no seu livro sobre Marcel Duchamps, que diz assim: “Não há nada escrito sem o gosto. Com efeito, o gosto se recusa ao exame e ao juízo: é um assunto de provadores”.

Na língua Hindu, a essência da palavra Poesia remete a sabor.

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Noite da Biblioteca – Desde alguns poemas de Armando Freitas Filho

Por Paulo Vidal

Experiência muito diversa da leitura silenciosa, ouvir esses poemas assinados pela voz de Armando Freitas Filho ressalta que a poesia faz dançar as palavras, faz dançar o som com o sentido, envolvendo nas palavras do poema Absoluto Azul “voz e corpo”, o corpo falante. Ao passo que, nos discursos correntes, o som serve para discriminar o sentido – você disse pata ou lata? -, a poesia injeta som no sentido, resto cantante (Celan) que fura o sentido.

Há experiências cujo relato solicita o fazer poético, entre elas inegavelmente o amor. Ainda em Absoluto Azul ouvimos “e como o amor se lança/ sem esperar a ponte concluir/seus lances, cálculos”. O amor elabora um saber tomando por ponte significantes do Outro, só que estes não levam à margem oposta, tornando necessário que o sujeito coloque algo de seu, invente um saber singular que ressoe no corpo um excesso não formalizável via “cálculos”. Em vez da cor azul absoluto, temos absoluto azul. Ora, o que é se lançar no absoluto, naquilo que só tem relação consigo mesmo, senão sair de si para o Outro, uma alteridade infinita? Entre centro e ausência, a poesia de Armando cria uma erótica não casta.

Apelidemos de vida, gozo, tal excesso que não cabe de todo no texto, que perturba a fluidez usual da palavra nesses poemas, multiplicando as repetições, paronomásias, aliterações, enjambements. Se o mavioso canto do rouxinol classicamente figurou a arte poética, o rouxinol faz aqui a língua gaguejar, explorando uma tensão entre pares antitéticos: mecânico/vivo, inorgânico/orgânico.Antes de engenheiro com seus cálculos, o poeta é escultor, tenta cinzelar o corpo para que dele emerja a carne no poema: “No seu corpo/ vestido de cetim/ tão sentido como este desejo/ segunda pele que desliza/ sobre sua nudez/ em carne viva/ à beira do sangue e do colapso/ eu me debruço/ álacre, mas minha fome/ nem sequer alcança ou arranha/ o escudo de esmalte/ da sua beleza, não atravessa/ seu corpo de cromo/ o lacre/ escarlate do sexo, o nicho/ de verniz e veludo roxo/ onde o beijo/ da minha boca sonha aninhar-se”.

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